segunda-feira, 28 de setembro de 2015

O Silêncio das Palavras Verdadeiras






.
.
.

Bem guardadas,
Tesouros irreveláveis,
Á espera de serem articuladas,
Algumas, são por muitos veneradas,
Proferidas por seus donos pouco fiáveis,
Escravos delas e tal como elas articuláveis,
Por aí à solta, de boca em boca libertadas,
Bem acolhidas, por outros insuportáveis,
Pela ligeireza da bífida língua fustigadas,
Á mentira e à verdade indispensáveis,
Doces e leves, amargas e pesadas,
 Alívio, ou doem como pedradas,
São de amor ou detestáveis,
      Só ao silêncio confiadas!...   


E é em silêncio que devem ser ouvidas,
Escutadas com ouvidos livres de asneiras,
Que não sejam muitas delas confundidas,
   Com o silêncio das palavras verdadeiras!...
.
.
.



sábado, 19 de setembro de 2015

Partindo... e Ficou!...

.
.
.

As cores secando,
Desistindo
O olhar sobrando,
As folhas voando,
Caindo,
Sorrindo,
A memória desfolhando,
Luzindo,
Recordando,
Sonhando
O sonho mais lindo,
Regressando
Quase conseguindo,
    Chorando!...

A morte que regressa depois de regressar,
Partira depois da morte, antes de partir,
        E ficou!...
Viera ver a saudade antes de a matar,
 Morreu de saudade antes de se ir,
       E ficou!...
    O olhar,
As folhas antes de cair,
O mesmo amor e a saudade de amar,
O que partiu e o que há, de partir,
      A saudade que há, de ficar!...
      E ficou!...
.
.
.


terça-feira, 15 de setembro de 2015

Caminho (Ontem, Hoje e Sempre)


.
.
.

Ontem fui viagem,
Levei-O em meu caminho comigo,
Fez-se caminho à minha passagem,
     Sou o caminho que me leva consigo!...

Hoje continuo a ser caminho,
N’Ele, sou verdade de caminhos seus,
Com Ele em mim, não caminho sozinho,
     N’Ele, em mim, sou o caminho de Deus!...

E, se em meu caminho encontrar a dor,
Em suas mãos confiarei meu fiel destino,
 Serei encontro feliz sob o seu esplendor;

Amanhã continuarei humilde peregrino,
 Serei d’Ele, a paz, sua Palavra e seu amor,
     O meu trajecto livre, abençoado e divino!...

    
.
.
.


"Soneto dedicado aos diversos,
que me vão confundindo com diversos padres, 
alguns dos quais, não sei quem são!...
Baseado no mote dado por um Padre muito culto
que nem deve saber que o deu"




domingo, 13 de setembro de 2015

Certeza da Dúvida Ancestral


.
.
.

O apelo iluminado das raízes ancestrais,
A raiz que se aproxima e o próximo sinal,
O sol deposto por não pôr-se, jamais,
E o renascer da dúvida ancestral,
Sem ter conhecido a luz final,
Entre outras luzes iguais,
    Ou à sua luz única, igual!...

A questão posta aos anos que passam pelo nosso ser,
Sem ser sabedoria que nos preencha de tempo,
Que nos encha sem nos preencher!...
Talvez saibamos a resposta sem nada saber,
Como se nada houvesse a saber sobre o crescimento,
E, como um momento que cresce a cada momento,
Acontecem certezas que não param de crescer,
   Entre dúvidas que brilham no firmamento!...

Sob as estrelas que brilham no olhar,
Chegados, finalmente, ao cume do que fomos,
Acima de tudo, sabemos que não podemos voltar,
 Á certeza de não voltarmos a saber o que não somos,
     Por saber que já brilhamos o que tínhamos a brilhar!...

Nos ancestrais braços da melancolia,
Com a melancolia no ancestral coração,
Erguemos os olhos até à ancestral sabedoria,
   Onde os sábios O procuram, à procura da razão!...
.
.
.



terça-feira, 25 de agosto de 2015

Viagem ( A descoberta)

.
.
.

Tudo, meus olhos quiseram possuir,
Quiseram ser vistos por todo o olhar,
Que todos os olhos me vissem viajar,
Por esse mundo fora, sempre quis ir,
Ver os outros olhos verem-me partir,
 Vê-los invejosos ao verem-me voltar,
   Logo partindo, para continuar a vir!...

Continua minha satisfação insatisfeita,
E não sei qual a razão dessa miragem,
Tudo foge deste olhar que se estreita,
Há um olhar meu que me espreita,
Bem dentro de mim,
Desconhecido jardim,
Vou para fora de meu ser em viagem,
Há uma saudade que comigo se deita,
Viajamos fora de nós, de passagem,
Aproximo-me do fim,
E volto vazio de tudo, sem bagagem,
De olhar vazio, sem a viagem perfeita,
Enche-se, meu olhar, de coragem,
  E comigo se deita,
      Viajando… assim!...

...tão perto eu estive do que era,
Do vivo regato que em mim vive,
 Onde bebe, eterna, a Primavera,
 Saciando-me como eu o quisera,
  Procurei-me onde nunca estive,
     Na Alma onde sempre estivera!...

Viajo agora por mim adentro,
Numa viagem onde me confesso,
Descubro a minha Alma no centro,
    Viagem sem partida nem regresso!...


.
.
.

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Perfume do Suor

.
.
.


O costume,
Transparente e macia,
A pele suave que se assume,
Branca de luar, branca à luz do dia,
A tranquilidade da noite que a possuía,
Sensível e sossegada, sem um queixume,
A assunção do ócio e o frasco da doce poesia,
  Longe dos corpos suados, coberta de perfume!..

Recolhia-o das axilas e o que escorria da testa,
Conhecia o sabor salgado do fruto, de cor,
Talvez fosse perfume que não presta,
Desagradável fragrância modesta,
Do trabalho, fruto do melhor,
Dizem ser cheiro do pior,
Substância honesta,
    Salgado suor!...

.
.


.

  

sábado, 15 de agosto de 2015

Soneto à Portuguesa - Grinalda ( As putas dos Laranjais)

.
.
.

Saberiam a mel as laranjas prometidas,
Verde esperança das laranjeiras em flor,
Antes das laranjas, foram flores fodidas,
      Nos laranjais onde se confundira o amor!...

Casta e pura, a pura flor de laranjeira,
Esquecida flor pela laranja que nasceu,
Caiu a doce laranja na inocente asneira,
     Todo o laranjal, murchou e apodreceu!...

Fizeram das donzelas putas perdoadas,
Entre grinaldas obrigadas a endoidecer,
Enlouqueceram as inocentes abusadas;

Florescem de tristeza, ávidas de prazer,
São fruto apetecido mas nunca amadas,
     Flores que nos laranjais morrem a foder!...

.
.
.


domingo, 9 de agosto de 2015

Tão... Tantas, as Almas...


.
.
.

Tantas almas perdidas,
Á espera das despedidas,
Tantos, os lenços sem dono,
Tantas, as almas ressentidas,
Á espera do seu fiel patrono,
Tantas, as almas ao abandono,
Tantas, as primaveras fingidas,
Á espera de um triste Outono,
   Tantas são as árvores despidas,
Por seus deuses em seu trono,
     Tanta fé à espera das partidas!...

Tanto santo lenhoso,
Tanta santa de porcelana,
Á espera do machado piedoso,
Á espera da beata pedrada insana,
Tão lenhosa é a pobre alma humana,
Tão insignificante é o lenho milagroso,
 Á espera da religiosa alma profana,
  Tão profano é pecado religioso,
     Que por Deus se engana!...

Tão pouca fé no semelhante,
Tão pouca fé na fé viva da Vida,
Tanta é a fé no caruncho cintilante,
Tão pouca é a fé na fé d’Ele renascida,
Tanta é a fé na vaidade degradante,
     Tão pouca, a fé em desgraça caída!...

Tão perto está o pessimismo,
Tão longe está o pessimista,
Tão perto está o abismo,
Tão longe o humanista,
     Tão em nós, o egoísmo!...

Tão ocos de alma,
Tão vazios da verdade,
Tão insaciáveis de vaidade,
 Que nem Deus os acalma,
      Em sua infinita bondade!...
.
.
.

    


sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Crianças, a Fome e a Fome de Leão

.
.
.

Acordo sem deixar de dormir,
Neste sonho que me enrola,
Ou, talvez não…
Não sei ler e volto à escola,
Não há quem me possa acudir,
Acudo-me num rabisco farsola,
O professor é um terrível anão,
Escreve de espingarda na mão,
Solto um grito e vejo-me a cair,
Caio numa oferta, sou a esmola,
Sou o jantar de um famoso leão,
Engolido, passo por uma argola,
É ouro que a noiva está a vestir,
Visto-me e avisto-me a despir,
Não tenho qualquer ereção,
Revisto-me sem consolação,
Sinto prazer que deixei de sentir,
Sinto uma nudez que me esfola,
Sou coelho a dormir na caçarola,
Ou, talvez não…
Acordo em corvo cor de carvão,
Sobrevoo uma criança sem gramática,
Tão indecifrável é a linguagem do cifrão,
Enrola-se a língua à língua que se enrola,
Blábláblá... qualquer coisa e um pouco de pão,
Voam os chapéus que sacam coelhos da cartola,
Cada cartola mais alta é uma cartola democrática,
Foram-se os coelhos mágicos e só ficou uma pistola,
A fome de uma criança aponta a pistola automática,
Aponta às dores de dentes do regressado leão,
Contrata-se um dentista, por caça, fanático,
E antes que o mudo mundo grite não,
Os pássaros morrem numa gaiola,
As crianças tomam uma decisão,
O medo da vida é sintomático,
     E morrem com determinação!...

Acordo sem deixar de dormir,
Sonho com um leão feito de luz da lua,
Há um sol que para alguns só brilha a fingir,
Caçadores de leões são a humanidade no devir,
    Crianças morrem nos dentes da fome que continua!...
.
.
.



terça-feira, 28 de julho de 2015

Ritual da Troca ( Corrupção do Desígnio)



.
.
.

O soslaio do olhar,
A ordem das coisas, o trocar,
Diabo por Deus, o novo ofício,
A vida, a morte, o querer salvar,
A morte, a vida, o matar,
A inocência e o sacrifício…
O último pecado,
O princípio do fim,
Deus desautorizado,
Proibido de ser Deus, ignorado,
Cisma dos sem Deus…
                                                         Assim!....

Juntaram desejos comuns e os significados,
À volta do medo de uma morte anunciada,
Em silêncio, era outra a morte desejada,
Havia silêncio nos olhares trocados,
Por Deus podiam ser castigados,
A noção da morte trocada,
     Desejos desesperados!...
                
Olharam, inconformados,
 O vivo em julgamento dispensável,
A morte de quem faz falta é impensável,
A vida só devia ser dada aos autorizados,
Todos os pobres teriam os dias contados,
Só o filho de alguém seria saudável,
      Á luz negra dos olhos cegados,
         Da perdida alma insensurável!...

E seria a morte amável,
Se o homem de outra levasse,
Falso desígnio que em vida ficasse,
Em vez da oferta pela morte irrecusável,
Oferecida à morte que noutro homem ficasse,
Em vez do pai, do filho e do marido indispensável,
Mas, não!…
Nem o desapego,
O bruxedo enrodilhado,
Apaziguaria o desassossego,
De tão cego egoísmo embruxado,
Enegrecido pela recusa do desígnio sagrado,
Desígnio de Deus que fora sempre aconchego,
Até chegar a hora do destino marcado,
Esse dia que sem amor nem apego,
Tem por destino ser recusado!...

Juntaram-se à volta da pouca sorte,
Rezaram silêncios cúmplices numa só direcção,
Apontaram o inocente que estava mais à mão,
-Toma-o, ó morte!...
Abraça esse inútil e devolve-nos a paz,
Leva a vida em vão desse que nada nos trás,
Troca-a pela morte do meu, deixa-o ivo e forte!...
Em silêncio, te imploramos que leves o outro, ó morte,
Leva esse pai dos filhos dos outros, só o nosso nos apraz,
    Deixa-nos a vida dos nossos e leva a daquele que nada faz!...

Olharam com condolência,
O vivo!...
Procuraram nele um motivo,
Havia-lhes nos olhos uma confidência,
Encontraram um olhar compreensivo,
E a pena resumida num só substantivo,
Do silencioso egoísmo e da consciência
Ao sentir uma inexpressiva experiência,
     Do merecimento de viver ser subjectivo!...

À noite, a noite silenciosa,
Olhou a madrugada por um longo momento,
À noite, a noite silenciosa,
Olhou o dia e o amaldiçoou, angustiosa,
À noite, na noite de um lamento,
Adormece uma fria lágrima ao relento,
Coberta por uma lágrima piedosa,
  Levada pelo destino sempre atento!...

Ao anoitecer da vida, num dia qualquer,
Todos partirão, sem querer nem alento,
      Mas só quando Deus quiser!...


.
.
.