terça-feira, 25 de agosto de 2015

Viagem ( A descoberta)

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Tudo, meus olhos quiseram possuir,
Quiseram ser vistos por todo o olhar,
Que todos os olhos me vissem viajar,
Por esse mundo fora, sempre quis ir,
Ver os outros olhos verem-me partir,
 Vê-los invejosos ao verem-me voltar,
   Logo partindo, para continuar a vir!...

Continua minha satisfação insatisfeita,
E não sei qual a razão dessa miragem,
Tudo foge deste olhar que se estreita,
Há um olhar meu que me espreita,
Bem dentro de mim,
Desconhecido jardim,
Vou para fora de meu ser em viagem,
Há uma saudade que comigo se deita,
Viajamos fora de nós, de passagem,
Aproximo-me do fim,
E volto vazio de tudo, sem bagagem,
De olhar vazio, sem a viagem perfeita,
Enche-se, meu olhar, de coragem,
  E comigo se deita,
      Viajando… assim!...

...tão perto eu estive do que era,
Do vivo regato que em mim vive,
 Onde bebe, eterna, a Primavera,
 Saciando-me como eu o quisera,
  Procurei-me onde nunca estive,
     Na Alma onde sempre estivera!...

Viajo agora por mim adentro,
Numa viagem onde me confesso,
Descubro a minha Alma no centro,
    Viagem sem partida nem regresso!...


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quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Perfume do Suor

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O costume,
Transparente e macia,
A pele suave que se assume,
Branca de luar, branca à luz do dia,
A tranquilidade da noite que a possuía,
Sensível e sossegada, sem um queixume,
A assunção do ócio e o frasco da doce poesia,
  Longe dos corpos suados, coberta de perfume!..

Recolhia-o das axilas e o que escorria da testa,
Conhecia o sabor salgado do fruto, de cor,
Talvez fosse perfume que não presta,
Desagradável fragrância modesta,
Do trabalho, fruto do melhor,
Dizem ser cheiro do pior,
Substância honesta,
    Salgado suor!...

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sábado, 15 de agosto de 2015

Soneto à Portuguesa - Grinalda ( As putas dos Laranjais)

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Saberiam a mel as laranjas prometidas,
Verde esperança das laranjeiras em flor,
Antes das laranjas, foram flores fodidas,
      Nos laranjais onde se confundira o amor!...

Casta e pura, a pura flor de laranjeira,
Esquecida flor pela laranja que nasceu,
Caiu a doce laranja na inocente asneira,
     Todo o laranjal, murchou e apodreceu!...

Fizeram das donzelas putas perdoadas,
Entre grinaldas obrigadas a endoidecer,
Enlouqueceram as inocentes abusadas;

Florescem de tristeza, ávidas de prazer,
São fruto apetecido mas nunca amadas,
     Flores que nos laranjais morrem a foder!...

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domingo, 9 de agosto de 2015

Tão... Tantas, as Almas...


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Tantas almas perdidas,
Á espera das despedidas,
Tantos, os lenços sem dono,
Tantas, as almas ressentidas,
Á espera do seu fiel patrono,
Tantas, as almas ao abandono,
Tantas, as primaveras fingidas,
Á espera de um triste Outono,
   Tantas são as árvores despidas,
Por seus deuses em seu trono,
     Tanta fé à espera das partidas!...

Tanto santo lenhoso,
Tanta santa de porcelana,
Á espera do machado piedoso,
Á espera da beata pedrada insana,
Tão lenhosa é a pobre alma humana,
Tão insignificante é o lenho milagroso,
 Á espera da religiosa alma profana,
  Tão profano é pecado religioso,
     Que por Deus se engana!...

Tão pouca fé no semelhante,
Tão pouca fé na fé viva da Vida,
Tanta é a fé no caruncho cintilante,
Tão pouca é a fé na fé d’Ele renascida,
Tanta é a fé na vaidade degradante,
     Tão pouca, a fé em desgraça caída!...

Tão perto está o pessimismo,
Tão longe está o pessimista,
Tão perto está o abismo,
Tão longe o humanista,
     Tão em nós, o egoísmo!...

Tão ocos de alma,
Tão vazios da verdade,
Tão insaciáveis de vaidade,
 Que nem Deus os acalma,
      Em sua infinita bondade!...
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sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Crianças, a Fome e a Fome de Leão

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Acordo sem deixar de dormir,
Neste sonho que me enrola,
Ou, talvez não…
Não sei ler e volto à escola,
Não há quem me possa acudir,
Acudo-me num rabisco farsola,
O professor é um terrível anão,
Escreve de espingarda na mão,
Solto um grito e vejo-me a cair,
Caio numa oferta, sou a esmola,
Sou o jantar de um famoso leão,
Engolido, passo por uma argola,
É ouro que a noiva está a vestir,
Visto-me e avisto-me a despir,
Não tenho qualquer ereção,
Revisto-me sem consolação,
Sinto prazer que deixei de sentir,
Sinto uma nudez que me esfola,
Sou coelho a dormir na caçarola,
Ou, talvez não…
Acordo em corvo cor de carvão,
Sobrevoo uma criança sem gramática,
Tão indecifrável é a linguagem do cifrão,
Enrola-se a língua à língua que se enrola,
Blábláblá... qualquer coisa e um pouco de pão,
Voam os chapéus que sacam coelhos da cartola,
Cada cartola mais alta é uma cartola democrática,
Foram-se os coelhos mágicos e só ficou uma pistola,
A fome de uma criança aponta a pistola automática,
Aponta às dores de dentes do regressado leão,
Contrata-se um dentista, por caça, fanático,
E antes que o mudo mundo grite não,
Os pássaros morrem numa gaiola,
As crianças tomam uma decisão,
O medo da vida é sintomático,
     E morrem com determinação!...

Acordo sem deixar de dormir,
Sonho com um leão feito de luz da lua,
Há um sol que para alguns só brilha a fingir,
Caçadores de leões são a humanidade no devir,
    Crianças morrem nos dentes da fome que continua!...
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