sábado, 16 de abril de 2016

Olhos de Primavera

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Esta chuva que não para de cair,
Dos olhos onde urzes florescem,
São saudades do que está por vir,
    Dias que nos olhos amanhecem!...

Caem lágrimas mansas e serenas,
Das nuvens que embranquecem,
Foram pombas de brancas penas,
    As nuvens que não se esquecem!...

Teus olhos de violeta pranteados,
Espreguiçam-se sobre a verdura,
Agora olhos de sonhos azulados;

 Sol e o sorriso, dois raios dourados,
Suave azul do céu e a tua brancura,
    Primavera em teus olhos aliviados!...

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terça-feira, 12 de abril de 2016

Culto (O Outro Mundo)


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O flash e os olhos cegos,
Olhar em ruínas terrestres,
A humanidade dos mestres
As peças perdidas de legos,
Os artefatos extraterrestres,
Construções e alguns pregos,
     Inocência e amoras silvestres!...

A luz que na luz se apaga,
A penumbra e a cegueira,
Os fanatismos e a asneira,
Silêncio das trevas e a saga,
A consciência sempre vaga,
A mentira sempre ligeira,
Alguma verdade aziaga,
De um mundo inteiro,
A vida pelo dinheiro,
     E a morte que afaga!...

A sombra das pirâmides invertidas,
O Sol no olhar das sombras perdidas,
O Sol despido a perder-se na noite nua,
A virgindade perdida, abandonada na rua,
O fulgor das consciências corrompidas,
A sombra da sombra de muitas vidas,
Os uivos selvagens dedicados à lua,
A crueza fria das almas vencidas,
O calor das lágrimas vertidas,
O sabor da verdade crua,
A luz que se perpetua,
      Das sombras sentidas!...

O eclipse do olhar,
O apocalipse dos credos religiosos,
Os olhos caídos sobre Deus a chorar,
As lágrimas de Deus a transbordar,
A fúria dos mares tenebrosos,
Os crentes cautelosos,
Deuses a mendigar,
Ricos poderosos,
O poder de salvar,
Nos olhares luminosos,
E a morte que avança devagar,
Lenta, muito lenta, sem se apressar,
Tão lenta se arrasta entre momentos preciosos,
Enquanto dorme a justiça à sombra dos vagarosos,
Que, mal a morte deles se aproxima, apreçam-se a acordar,
Á luz dos seus desejos, despem o mundo e cobrem-se, lustrosos,
Despidos de toda a humanidade e esperança de Amar!...

Os olhos de quem de nenhum olhar se liberta,
O olho de milhares de olhos que tudo observam,
Olhos nervosos de pirâmides que não se enervam,
Pedra sobre pedra à volta do coração que se aperta,
Coração empedernido em agonia na alma deserta,
      De escravos dos que todas as verdades acervam!...

Lâminas muito frias de irresistível perfume,
Perfume frio envolto no mais secreto lume,
Lume fechado em doce gelo muito quente,
O fogo afiado no inferno de cada frio gume,
Ardendo até ao frio coração contundente,
Entre as paredes de fogo até ao cume,
O semear da morte e da semente,
Semear a morte que se assume,
E prolifera-se vivamente,
Sem um queixume,
Do obediente,
   O costume!...

Fechamos os olhos desnecessários,
Sem qualquer necessidade de os ter,
Inúteis, esses nossos olhos ordinários,
   Que nunca outros olhos quiseram ver!...




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terça-feira, 29 de março de 2016

Hera de uma Era e a Luz

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Arriscando entre a luz em perigo,
Entregou-se à luz ténue da fresta,
Não era a fresta um cómodo abrigo,
Era o caminho que caminhava consigo,
Caminhos entre uma iluminada floresta,
Onde as árvores cresciam em festa,
   Natureza de um costume antigo!...

Espreitou a luz que a espreitava,
Trepou com a luz dos seus sonhos,
Entre trevas e pesadelos medonhos,
E o medo que atrás dela desmedrava;
Enfim, a luz e todos os rostos risonhos,
Não se despedira dos rostos tristonhos,
    Era tanta a luz que os sonhos iluminava!...
Uma luz imensa,
A vida expandida das fontes,
Lembrou-se da fresta, viu pontes,
Abriu suas folhas viçosas à recompensa,
Cresceu rapidamente até novos horizontes,
Até sentir um corte que a deixou suspensa,
Na luz que dela se ia esvaindo!...
Ainda sentiu suas folhas caindo,
Caía nas trevas ao corte da foice fria,
Era o sonho que pela fresta se ia,
O fim da única Primavera,
Triste fim de mais uma Era,
A liberdade em agonia,
Era a luz que morria,
Como quem espera,
O que sempre quisera,
    À luz livre de cada dia!...



“Todos os pecados são enterrados vivos,
Sepultados sem pecado, para viver in Natura,
Vivem alimentados pelos mais puros motivos,
    Das flores que crescem em cada sepultura!...”
  
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domingo, 28 de fevereiro de 2016

O Douro e o Rabelo

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Há no Douro um feitiço,
Das suas ninfas há um apelo,
Assinou o rio um compromisso,
Seria mágico e mais do que isso,
Exposto seria todo o seu anelo,
Por suas ninfas, pleno de zelo,
E para sempre submisso,
     Á vontade do Rabelo!...

Navegam os Rabelos,
Com suas ninfas enfeitiçadas,
Mulheres pelo Douro apaixonadas,
Soltam ao Douro seus longos cabelos,
Salvam os Rabelos dos seus desvelos,
    Ninfas do Douro por Rabelos beijadas!...

Lá vai o Rabelo com suas pipas de vinho,
Sempre sorrindo no abraço do Douro,
Sempre solitário mas nunca sozinho!...
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domingo, 31 de janeiro de 2016

Saudade sem existência


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Eram suas as suas saudades,
Saudades que nunca quis ter,
Alimentou-se de frugalidades,
Pratos vazios de necessidades,
Pouco mais desejou para viver,
Só queria ter saudades de ser,
Diferente das suas brevidades,
    Saudades suas antes de nascer!...

Morreu a saudade por ninguém,
Da saudade que de saudades viveu,
Saudades da saudade de alguém,
   Que de saudades não morreu!..
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quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Eu, a despeito da potestade

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Nada me empurra para trás,
Resisto ao dia seguinte,
E, por conseguinte,
Nada do que será feito me faz,
Tanto faz, a palavra reconstituinte,
Que, por conseguinte, será de paz;
A guerra que ninguém prometeu,
Está prometida,
Por conseguinte, digo eu,
Que eu resisto à verdade escondida,
    De tudo que dentro de mim, é meu!...

Nada do que me acusam,
É mentira!...
Tudo que digam a meu respeito,
A despeito do despeito,
É verdade!...
A respeito do respeito pela verdade,
A despeito do despeito da potestade,
Por maior que seja o poder do preconceito,
Jamais fará de mim um verbo de corpo perfeito…
Nada nem ninguém,
Por mais que tenham respeito por mim, também!...

Este é o ultimo dia dos dias que hão, de vir,
Ninguém se lembra do primeiro choro de Mãe,
    Mas todos choram quando deveriam rir!...
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quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Braços caídos - Até ao Futuro

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Em teus braços de verdes ramos,
Por tuas verdes folhas envolvidas,
Dormem cores de Outono caídas,
   No velho regaço dos verdes anos!...

O aconchego no ninho de inverno,
Calor da ternura, o afago do vento,
Sem o existir das horas e do tempo,
      Mais um dia, mais um abraço terno!...


Há milagres esperando os penitentes,
A negra esperança, o abraço nefando,
 De braços caídos em anos descrentes;

Inesperada luz que foi desmaiando,
Anoitecendo as auréolas inocentes,
    Pra trás da inocência foram ficando!...


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terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Cio das Sombras e dos últimos Dias

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Saberão os dias resistir,
Aos dias ferozes que se abeiram,
Por mais que resistam os dias de sentir,
Sem o sentirem, acabarão por sucumbir,
   E terão fim, por mais que não queiram!...

Há dias e há dias de verdade,
Há dias e há dias que mentem,
Verdades dos dias que sentem,
Não se escondem da saudade,
Amanhecendo-se na claridade,
Do dia findo que pressentem,
E anoitecem na luzente idade,
Das mentiras que consentem,
    Por tristeza e triste bondade!...

E os dias que não são dias,
Escondidos no tempo fugidio,
Acordam das noites sombrias,
Como sombras cobertas de cio,
     Possuídas por auroras fugidias!...

São os dias que não resistem,
Às noites amantes que caem,
Entram nas noites e insistem,
    Prostituem a verdade e saem!...
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domingo, 27 de dezembro de 2015

Nuvens de Corvos (Mais tarde ou mais cedo)


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Mais cedo ou mais tarde,
Vemos uma nuvem que desanima,
Aproxima-se em silêncio, sem alarde,
Escorre por sua pouco líquida auto estima,
Sua memória do arco-íris já não a mima,
Está perto do inferno sem cor e arde,
  Cai sobre nós, com o céu em cima!...

Mais tarde ou mais cedo,
As nuvens mais brancas escurecem,
Desabam sobre espantalhos, em segredo,
Não haverá raios de Sol que espantem o medo,
Searas de trigo cobrem-se de corvos e arrefecem,
Erguendo-se da terra, nuvens de corvos amanhecem,
Para escurecerem o pão em seu triste arremedo,
Longe do Sol que já não vêm e falecem!...

A três dias do fim do último dia,
Logo após a esperança nascer,
A terra grávida de agenesia,
Viu uma árvore esmorecer,
A chuva desaparecer,
E tudo que sentia,
     Secar e morrer!...

Mais tarde ou mais cedo,
As nuvens de corvos voltarão,
Chuva de penas negras escorrerão,
E aos olhos da Terra coberta de medo,
Enterrar-se-á o princípio do fim da razão,
     Haverá chuva, mais tarde ou mais cedo!...

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sábado, 28 de novembro de 2015

Fome

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Dos rostos mais feios da espécie que nos devora,
É a vergonha mastigada por uma adefagia doente,
Uma fome alimentada com a maldade de muita gente,
Diferente fartura de Espírito, alimento das almas de outrora,
A mesma fartura em falta da fria humanidade que já não chora,
Chorando solidariedade hipócrita na exposta miséria conveniente,
Sedutor donativo depositado para abastados vencimentos na hora,
Herdadas contas insaciáveis de candidaturas legítimas a presidente,
Prometida manteiga a derreter no ougado pão que à boca demora,
É tudo isso calor do momento que a fresca esperança não melhora;
Estando a mesa de reis garantida, esquece o rei seu povo indigente,
Continuando o resignado castigo de um comido povo imprudente,
    Avesso virado no interior de anorética moda disfarçada por fora!...

Rei dos espermatozoides mais fracos,
Impunha sua lei de ejaculações contidas,
Estrangulando inatingíveis orgasmos velhacos,
Com a verga amolecida por desidratados buracos,
E simulava falsas palpitações de farturas fingidas,
Como se nadassem em prazer pelo prazer nutridas,
Mas tudo se foi desmoronando em orgânicos cacos,
Quando muita da fome encoberta por olhos opacos,
Revelou dispensas vazias de fertilidade desprovidas,
Restando um forte bafio exalado de esquálidos nacos,
    Herdeiro possível de escondidas migalhas perdidas!...

Gratos pelo fundo migado da lambida tigela,
Mimos empedernidos cavam salgados granitos,
Matando a fome com a sede mortal dos malditos,
Cozinhando vómitos com as migas que o medo martela,
Mas são deliciosas as migas guardadas pelo Amor bendito,
De pais sacrificados na luta contra a fome que filhos flagela,
    Trabalhando os calos ásperos de ódio por salário magricela!...

Sobre o caruncho dos ossos de mesas quebradas,
Sentam-se costas de cadeiras coladas ao abdome,
Esperando o bolor esquecido em pratos sem nome,
Enquanto à farta vergonha de lágrimas esfomeadas,
Se junta a seca penúria de alcunhas envergonhadas,
    Alimentando o choro com tristes lágrimas de fome!...

Atentados à pobreza são pagos em instituições de caridade,
Com a caridade dos pobres servida à mesa pelo pobre cicerone,
     Repastos de pobreza cozinhada na inópia da mirrada solidariedade!...
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