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domingo, 18 de maio de 2014

Alumbramento dos Perfeitos


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Não negava ao olhar a vontade de se eximir,
Nos olhos estão as histórias que não se contam,
Outras histórias escondidas no olhar que quer fugir,
Não negavam o silêncio das histórias ficadas por ouvir,
Como olhos apagados que histórias de silêncio despontam;
Por cada silêncio, silêncios de outras histórias se aprontam,
E no vértice da pirâmide, um rádio não se cansa de difundir,
Paliam-se secretismos iluminados que não se confrontam,
Sobre a escravatura das pedras, o peso faz-se repetir,
     Esmaga-se a voz sob o silêncio que poucos apontam!...

Não negava o sonho ao vértice dominante,
Nem o pesadelo à esperança em futuros impossíveis,
Os olhares deverão ser hipnose de silêncios consumíveis,
O capitalismo obeso carrega o cume da pirâmide sufocante,
E, não obstante,
É leve a palavra livre escondida no olho do horizonte,
Longe do peso carregado pela oferta dos vícios aprazíveis,
E de outros vícios dados à felicidade da ignorância a monte,
E outras influências aos viciados mais suscetíveis…
Ácidos hipnóticos e a sucralose são irresistíveis,
Para lá da história dos olhos brota a fonte,
Nos rios dançam peixes invisíveis
Corre a água debaixo da ponte!...

Ainda por cima, e apesar de tudo,
Por cima das pontes e do controlado desalento,
O olho global move-se atento, num olhar de veludo,
Cega o resto da pirâmide que tem como escudo,
    É quase perfeito o poder do alumbramento!...

Não negava o silêncio no olhar,
Nem a nova ordem do encantamento,
    Assassina da velha ordem de o libertar!...
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terça-feira, 1 de abril de 2014

Equilíbrio da Mentira





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Eu gosto de mentir,
Sou, por assim dizer,
Um mentiroso;
Minto a mim mesmo sem o saber,
Sou a verdade sem o pretender,
Um espesso silvado carinhoso,
Um ínfimo existir grandioso,
Tão certo do escurecer,
Desse enganador mais brioso,
     Que, se não o sou, sou a cobiça de o ser!...

   Afinal, não havia meio mundo a enganar outro meio?!...
Bons tempos esses, de mentira e meia desequilibrada,
Esvaziava-se meio mundo já de meios enganos cheio,
Acreditando na mentira, ela mesma enganada,
Hoje são poucos os que se dizem felizes,
Por engano, confessam-se em deslizes,
Desses poucos, os amigos do alheio,
Fazem o mundo muito feio,
Onde quase todos são raízes,
De árvores fustigadas por cicatrizes,
Dando frutos a mentirosos sem receio,
    Que as regam com metros de longos narizes!...

Haja alguém que, por engano, se engane,
Que me engane se eu não estiver enganado,
Por enganadores tem sido o mundo atraiçoado,
Há muitos quem, pelo muito de poucos, se esgane,
    Preferindo um nó corredio, a viver envergonhado!...

Eu gosto de mentir, mas…
Até quando minto digo a verdade,
Sou um mentiroso, a verdade seja dita,
Sou o silêncio de minha parte que grita,
Grito o silêncio que mente à realidade,
    De muita mentira sempre desdita!...

  
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sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Direito Invaginado

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Fecundez de semente primordial,
Germinada na bainha de preservativo invaginado,
Rasga os lábios sobrepostos da membrana geracional,
Que sugam os coágulos brancos ao primórdio espiritual,
Dos corações rasgados entre sangue vivo derramado,
Sobre a inumanidade prenhe de amor coagulado,
    Na Paz morta por consentimento convencional!...

Milhões de planos plenos de vida,
São preservados em preservativos sem saída,
Preserva-se a triste morte do humano imperfeito,
Em laboratórios onde às cobaias de pleno direito,
É imposto o único direito de ver instituída,
     A Esperança que lhes fenece no peito!...

Cortaram-te as unhas afiadas,
À entrada do preservativo azul-celeste,
Sem tempo para perceber o mal que fizeste,
Ainda viste outras famílias escravizadas,
   No colonizador hexágono a Leste!...


E aqui estamos entre pregas de seis paredes semitizadas,
Erguidas com sangue de humanos imperfeitos e arame farpado,
    Amordaçados até à indiferença de nossas vidas invaginadas!...

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segunda-feira, 9 de maio de 2011

O Peregrino

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Uma infeliz criatura,
Já de nascença sem pernas para andar,
Prometeu até aos pés da Sagrada Santa rastejar,
Abrir-se aos ensinamentos da Sagrada Escritura,
Se aliviasse essa alma de tão injusta agrura,
Concedendo-lhe o milagre de caminhar!...

Num abençoado Maio santo de trovoada,
Entre raios fantásticos e misteriosos trovões,
Atirou-se aquela alma lá do alto de suas convicções,
Estatelando o rosto numa porção de trampa dejectada;
Entre lábios ensanguentados, limpou a língua toda borrada,
Enquanto com os dedos esfolados e com arranhões,
Pediu licença a Deus, antecipando mil pedidos de perdões,
Por soltar uns desabafos que deixou aquela alma aliviada:
-Foda-se!... Queixou-se ao acaso entre outros palavrões,
-Se não me nascerem umas pernas ao beijar os pés da Adorada,
Juro continuar sem andar e voltar a não acreditar em mais nada!...

Lá começou a rastejar no início do escolhido calvário,
E tal era a fé perneta daquela alma penitente,
Que em poucas horas já provara pedras de sabor diferente,
Saboreando pratos de terra no chão e contas de um rosário,
Alimentando-lhe as forças com que alargava seu vocabulário,
Pelo que praguejava por cada metro de provação indecente,
Na certeza do sacrifício ser mesmo necessário,
Para que o regresso não fosse plangente,
E a todos mostrar-se como crente voluntário!...

Subserviente à sua vontade carregada de fé peregrina,
Bem ataviados e formosos leigos de afortunada sina,
Passavam por ele espertos peregrinos de pé ligeiro,
Classificando aquela alma de meio peregrino verdadeiro,
Metade da fé de uma outra doutrina,
Avidez egoísta de quem quer chegar primeiro,
Sem a necessidade de ser o oportuno herdeiro,
Das migalhas guardadas por pecados de rapina,
Rastos de fome em restos de orgulho de cordeiro,
Sisados na metade da alma de meia morfina,
Que uma parte do corpo vendeu ao banqueiro,
Deixando a outra parte ao abandono na esquina,
Misturada na fé da carne que outra fé não ensina,
Outros meados credos de um credo inteiro,
Vedado a meias almas de meio corpo rasteiro!...

Das horas já inchadas de anos,
De cada centímetro um quilómetro ensanguentado,
Já sentia o perneta seu coração profano,
Ser dilacerado por chibatadas de delírio humano,
Entre lautos almoços do mais fino pó só aos eleitos reservado,
Em fartas ceias de excremento vário de terra misturado,
Ainda serviu de meio tapete à passagem de outro meio engano,
E, ainda que espezinhado,
Só não foi rasteirado,
Porque, já se sabe, faltavam as pernas ao pobre Lusitano;
Reconhecendo um hábito de poder soberano,
Já que qualquer romeiro sobre ele passava,
Arrastou-se com a pouca força que lhe restava,
Convidando o voto de castidade a servir-se de seu corpo insano,
Ensaiando olhares de suposta sedução estranha no caminho atravessada,
Como uma espinha de peixe podre na garganta espetada,
Provocando náuseas ao clérigo da tenra carne em sagrado segredo ufano!...


Desprezado e tão longe dos pés da Santa que prometeu beijar,
Com as unhas esgaçadas e já incapaz de dar mais um “passo”,
Nunca o faria, por aquele “andar”,
Porque se não levasse ao Destino o beijo que prometera dar,
Desejo que de Esperança se tornava escasso,
Seu sacrifício inumano seria considerado fracasso;
Ainda rodou o tronco sobre si mesmo, tentando sobre as costas avançar,
Mas com as mãos desfeitas e a falta de pernas como castigo crasso,
Tudo que conseguiu foi praguejar,
Ficando ali imóvel de papo para o ar,
Tal como seu parado olhar baço,
Procurando o azul do céu atrás de pesadas nuvens de negro despertar!...


Quando se preparava para ensaiar um ódio de vingança,
Enquanto ainda procurava o céu azul e um novo dia,
Um azul estranho espreitou sua desconfiança;
Parecendo fitá-lo lá do alto de algo que ele não entendia,
Um maltrapilho de barba empoeirada sua mão lhe oferecia,
Reparou no pobre peregrino uma desencorajadora semelhança,
Com a fome de quem sempre esteve bem longe da bonança,
E praguejou mais uns agradecimentos de escárnio a um deus seu guia:
-Obrigadinho por me enviares a ajuda mais pobre da hierarquia!...
E, enquanto a ironia desprezível era seu fiel da balança,
Vendo passar perto dele um gordo símbolo de abastança,
Arrastou-se célere, para longe do maltrapilho que desconhecia,
Temendo ser confundido com aquele tolo que a mão lhe estendia!...


-Ó vadio, segue o teu caminho e fica bem longe de mim!
Disse o aleijado ao estranho peregrino que sorria humildemente,
-Desaparece, instigou com desdém o sem-pernas, descrente,
-Não quero ser visto junto de um tão miserável assim,
E, continuando a desdenhar, disse que para a sua reputação seria ruim:
-Nem Deus quer saber de pobres como tu, ó demente!...
Se não és rico, mais vale à tua vida pores fim!
Mas o magro peregrino continuou sorrindo alheio àquele chinfrim,
E até prometeu carregar o alijado até ao templo do milagroso jardim!...


Olhando de soslaio, ainda no chão prostrado,
A primeira coisa que viu foi um par de sandálias disjunto,
Nos estranhos pés limpos daquele misterioso esfarrapado;
Rebolou, então, o olhar para um e outro lado,
Não fosse alguém vê-lo “daquilo” junto,
Lá acedeu o arrogante aleijado,
Deixando claro que não haveria mais assunto,
E não queria conversas ao ser carregado,
Porque do nada e ninguém era o tolo sorridente transunto,
Já encavalitado nas costas do bom Homem, ordenou irado:
-Toca a cavalgar bem depressa ó piolhoso bestunto!
E este, com sorriso amável, seguiu apoiado num esguio cajado!...


Entre esgares de desprezo e palavras injuriosas,
Bem seguro em cima do Homem que continuava a sorrir,
Aproximavam-se aquelas almas do sagrado solo de gente religiosa,
E se a caminhada, para uns, fora penosa,
Foi para aquela alma sem pernas uma esperança que começou a luzir,
Graças à bondade de outra Alma que a Esperança lhe deu sem ele a pedir!...
Um pouco antes de entrar em solo de milagres dos crentes,
O perneta puxou violentamente o cabelo do desconhecido prestável,
Fazendo de quem o ajudou uma travada besta miserável,
Desferiu o perneta ordens insolentes,
De intenções que ele mais achava convenientes,
E ignorando a ajuda sobre-humana de Alma tão admirável,
Imediatamente ordenou ao bondoso venerável:
-Põe-me no chão, ó besta de carga de todas as gentes,
Se os ricos senhores e pessoas tão influentes,
Me vêm acompanhado de uma figura como tu tão insuportável,
Será pouco provável,
Que a Santa adorada me dê um par de pernas valentes!


O Homem que o carregara desde os princípios da Fé,
Delicadamente o aconchegou no chão sagrado, na entrada do templo;
Sorrindo meigamente, olhou o Céu para logo desferir um santo pontapé,
Na primeira banca que vendia pecados da santa Sé,
Disfarçados de milagroso exemplo!...


Correndo à cajadada todo o mercado por tantos milagres feitos,
Com o cajado que nunca encontrou na bondade obstáculo,
Expulsou mercadores de ímpios proveitos,
Por ditos apóstolos de pressupostos purgados preceitos,
Elegendo em seu representante, mais um tentáculo,
De rico homem do cajado que transporta o sagrado Báculo!...


Anos passados, ainda rastejando entre a poeira da alma vencida,
Recorda o pobre aleijadinho sem suas pernas para andar,
Um passarinho morto que o Homem que o carregou fez voar,
Lembrou-se ainda de uma promessa não cumprida,
De sua Fé que sempre estivera perdida,
E da língua afiada que o privara de falar,
Mas, o que mais dói em sua Alma ferida,
É o sorriso meigo daquele olhar,
Que um dia lhe ofereceu nova Vida,
E que, por ingratidão, o aleijadinho não soube aceitar!...
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