terça-feira, 8 de outubro de 2013

Em Estado de Emprego Constitucional

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Governado por muito roubar,
Levou o rico desgoverno a decidir,
Mais um santo dia para o povo trabalhar;
De uma tristonha segunda à feliz sexta-feira,
Dia algum sente falta de isenção da primeira feira,
Logo a seguir há o sábado e o domingo para acalmar,
Antes de segunda, há mais um dia descontado por contar,
Um desses longos dias sem descanso inventados para descontar,
O oitavo dia das novas semanas mais longas e a dedução a extorquir,
Já registado em mais uma das muitas inconstitucionalidades a constituir,
    Da constituição composta por desiguais medidas de austeridade a consagrar!...

Nada há para fazer nos gabinetes congestionados pelo vazio onde nada se faz,
Pagam-se mais de doze meses ao ano, mais as férias a troco de nada fazer,
Depois de tanto descanso, são belos os dias que nos cansam de prazer,
Somos capazes de enganar a inexistência do trabalho mais incapaz,
Ainda que a função não exista, engendra-se uma defesa tenaz,
Luta-se pela falta de trabalho como trabalho útil a receber,
De um momento para o outro há uma esperança fugaz,
Juízes nebulosos juram a velha constituição defender,
Outros piores defendem o empobrecimento eficaz,
E o espírito da pobreza que não quer entender,
Pede explicações à política mais mordaz,
    Acabando de rastos ao pé do poder!...

E vá-se lá procurar saber,
Como desta pobreza sair,
Se os há a querer entrar,
Pensando em enriquecer,
Sem pensar em contribuir,
    Com o que hão, de roubar!...

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Procura-se um óptimo emprego,
Que esteja distante de qualquer trabalho,
    Dá-se como garantia a promessa de total apego!...
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terça-feira, 1 de outubro de 2013

Bordados Involuntários

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Cruzavam-se em qualquer caminho,
Dos seus caminhos traçados no deserto,
Cada qual, dentro de si caminhando sozinho,
Consumidos por ásperas vendas de bordado linho,
Fitas rasgadas nos olhos fechados em ponto aberto,
E nos olhos bordados,
Relevos desencontrados,
Cresciam atrás de agulhas do bordado mais incerto,
Não eram agulhas de aço a entristecer de desalinho,
Nem o tecido era toalha de altar dos pecados liberto,
Eram veredas, o caminho por toda a solidão coberto,
     Silêncio bordado no coração triste aberto ao espinho!...

Sem desígnios, os espectros transversais,
Bordam-se com a poeira que os atravessa,
Tempestades exaustas morrem nos areais,
A praia deserta e desertos são almas iguais,
    De olhos postos em alguém que as impeça!...

Todos vão passando pelo que passamos,
E não vemos passar quem por nós passa,
Somos caminho único da nossa desgraça,
    E por nossa desgraça todos desgraçamos!...
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segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Dr.Ed Ztone

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-Mãe, encontrei um planeta que encolheu,
Igual a um serôdio grão de milho!...
-Cala-te, filho,
Uma galinha vinda da lua já o comeu!...

Assim, “Dr.ed Ztone” nasceu,
Iluminado pelo solar brilho,
Que um dia seria seu!...

A uns dezoito milhões de quilómetros ludibriantes,
Depois de astronómicos milhões a todos eclipsados,
Não ficassem a ver estrelas e tudo ficaria como dantes,
     Se tantos cabeças na lua não tivessem sido enganados!... 

Para lá da lua onde ainda as bandeiras ondulam,
Há pulgas de cinema feitas com pixeis da ciência,
O fim do infinito finda-se em estado de incipiência,
Ao preço mais alto do segredo, as estrelas pulam,
Cobra-se o dinheiro até ao fim aos que os bajulam,
     E todos pagam para ver novos filmes da evidência!...

Dr. Fraude encontrou um novo sistema solar,
A cem milhões de pensamentos de distância,
-Pai, nos confins de ouro e milhões a ganhar,
      Encontrei mais um novo planeta por inventar!...
   -Cala-te, filho, isso já é ficção sem importância,
      Marcianos já o viram no último filme da Pixar!...
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quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Ele, Sabe-se Lá...

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Sabe-se lá se eu soubesse,
Qual o sabor que meu saber teria,
Talvez eu fosse o que eu quisesse,
Se por saber-me doce eu me fizesse,
Por não saber eu amargo saberia,
Se sem o saber muito eu seria,
      Havendo o que houvesse!...

Saber ao doce do muito saber,
Sem saber se o saber amargasse,
Não sabendo do quanto saber a ter,
Só sei que nada sei desse perceber,
Nem que o tanto saber bastasse,
A quem vê o que não sabe ver,
     E todo o saber amasse!...

Da vela ou à luz do dia,
Sabe a Alma de quem sabe,
Que de pouco valeu a sabedoria,
A quem alguma dor não via,
     E em si o Amor não cabe!...
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quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Desinspirado...

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Estou tão gasto de tudo, esgotado,
Vazio, seco de todos e sem ideias,
Sou terra exaurida entre as areias,
Onde, exaurido, arrefeço enterrado,
Não sinto aquele nada enfeitiçado,
    Que corre no vazio de minhas veias…

     E, árido, nem ávido sou de pousio!...

Sou este estranho curso evaporado,
No sumiço das margens desaguado,
Não procuro o significado de ser rio,
Sou esse caudal inerte e estagnado,
 Nem sol ou lua, nem quente nem frio,
Escurecido sem o defeito, sem o feitio,
    Não sou a noite nem o dia iluminado...

    Nem, aparte, ávido sou de consciência!...

Sou a minha própria consequência,
Sem saudades do siso desassisado,
Facto presente em minha ausência,
A gravitar fora de minha demência,
Adentrados auspícios do meu fado,
Suspensos no abismo ao meu lado,
    Ala que me esvazia sem clemência!...

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Aquém do que sou e rindo de mim,
Estou eu que ri do poético lampejo,
Rio também de belos rios que vejo,
A transbordar de tanta vida, assim,
Como se isso, a modos que, enfim,
      Não passasse de poesia ou gracejo!...

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Hehehehehehe….