quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

A Pedrinha




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Aquela pedrinha,
Ali sempre quietinha,
Nunca se queixava;
Batia-lhe, batia-lhe,
E não pestanejava,
Doía-lhe, doía-lhe,
E ali ficava!...

No regresso de cada patuscada,
Presságio e arrepio do que não pedira,
O monstro desaustinado, bêbado de ira,
Corria a Pedrinha à pedrada,
E por cada uma que lhe acertava,
Entumecia pelo ciúme que o impelira!

Depois, com o remorso, vinha a covardia,
Fugia o covarde para bem longe da Pedrinha,
Esquecia a Justiça que na pedra merecia,
Mas não a pequena Pedra mansinha!...

Num dia cinzento, quis a Pedra fugir,
Mas não tendo amigos para onde ir,
Ali ficou!...
Num Inverno em que Sol não havia,
Sentiu que a sorte mudava;
 A Pedrinha, que antes sofria,
E pelos castigos aguardava,
Agora já não aguentava,
Veio mais um que a possuía,
Mais um que seu sofrimento não via,
Se um a magoava,
O outro lhe batia!...

Apostavam ambos a Pedrinha,
Naquele cruel jogo da Vida,
Todos desejavam sua beleza de rainha,
Beleza dela sempre escondida;
Ora a perdiam,
Ora a ganhavam,
Numas vezes a agrediam,
Noutras a beijavam,
Se uns a maltratavam,
Dela, todos riam,
Outros bofetadas lhe davam!...

No fim de um Inverno,
A Pedrinha desapareceu,
Dizem por aí que morreu;
Para a Pedrinha de olhar terno,
Acabara uma vida de inferno!
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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

...depois


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…Depois,
Enquanto se desvaneciam os sonhos,
Das penas foram caindo todas as cores,
Aspergindo de negro coloridos amores,
Que murchavam em Jardins medonhos,
Essência maltratada de iludidas flores!

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domingo, 13 de fevereiro de 2011

Namoro do Pavão



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Duas penas e um Pavão,
A dança exuberante do ritual,
Papo rebentando de sedução,
Astucia do fascínio sem senão,
Sedutor Sol de calor consensual,
Um leque aberto de brisa visual,
Atiçando o fogo na paixão!...

Mais uma pena no papo,
-Ou duas e um tabu,
O Amor serve-se cru,
O beijo saboreia o priapo,
Do príncipe e não do sapo,
Sendo eu, até podes ser tu,
É que nisto de despir o nu,
E vestir a linha com um fiapo,
Pode ser remendo de farrapo,
Pena de pavão, beleza de peru!
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Será a flecha de Cupido,
Veneno de tesão danado?!...
Ou será Amor envenenado,
De Amor inocente fingido?!...
Talvez um lindo sonho colorido,
Com cores de Amor pintado!...

Talvez...


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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

À Margem


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Foi subjugado um forte rio,
Por duas margens apaixonadas,
Sempre se amaram apartadas,
Pelo ávido desejo de ser vadio,
Daquele manhoso curso vazio,
Amor de vivas águas esvaziadas!

Nesse vaidoso,
Rio sinuoso,
Que às margens se insinua,
Rola um seixo medroso,
Com cicatrizes de Lua,
Luar de banho vaidoso,
Perdido no poder amoroso,
Do desamor que desagua!

As margens lá continuam,
 De si ambas distantes,
Nada ficou como dantes,
Suas lágrimas já não desaguam!

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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Nuvem



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Vistosa,
Montou cúmulos de algodão,
E, Curiosa,
A dengosa,
Fez-se brisa de sedução,
Plena de paixão,
Silenciosa,
Gozando a fresca vibração,
De quem goza,
Posições de submissão,
Sobre nuvens de emoção,
E, fogosa,
A gulosa,
Lambia a ilusão,
Deliciosa,
Da nova posição,
Possuída pela ambição,
Ambiciosa,
Até à primeira contracção,
Nervosa,
Vindo-se em precipitação,
Satisfação,
De nuvem Preciosa!

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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Calendário



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Os ídolos colados na cal apodrecida,
Apagavam a memória dos calendários,
Entre as sumptuosas coxas e seios de diva,
Arregalavam-se os batidos dos olhos solitários,
Gastos orgasmos marcados nos desgostos diários,
Dos sonhos que se guiavam pelas estrelas da vida,
Talvez sonhos encantados, talvez estrela prometida,
Brilhando sob doze marcas dos prazeres ordinários,
Dias de cal viva queimados na esperança perdida!...
Foram caindo as folhas nuas dos velhos calendários,
Dos olhos precipitaram-se as despidas vendas,
Amontoam-se os dias na folha desiludida,
Dos meses nus deitados às calendas!

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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Réquiem


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Sirvam-me lágrimas de dor,
Em bandejas dilaceradas pelo amor,
Esse amor chorado,
Traído por sedução traída,
Traição germinada na lágrima consentida,
Pela lágrima do orgulho desprezada!

Chorem pelo sexo,
Chorem por amor,
Chorem lágrimas sem nexo,
Chorem pelo meu pensar complexo,
Por favor,
Chorem por mim!...
Ao meu choro digam sim,
Tenham pena deste meu estertor,
Escondam de vós penas de dor,
Que as lágrimas não demorem,
Mas, por favor,
Por mim chorem!

Venham ao réquiem do meu orgulho,
Retenham vossas lágrimas e saboreiem o engulho,
Afoguem-me em minha missa dos defuntos,
Para que possamos por mim chorar juntos,
Lágrimas da miserável pena, onde eu mergulho!

Cubram-me com vossas lágrimas sentidas,
Meu frio anseia por vossas lágrimas fingidas,
Afaguem minha esforçada vergonha serena,
Com texturas de vossas lágrimas de pena,
Fertilizante fracassado de lágrimas imerecidas,
Corpo meu de onde germina uma açucena!

Façam-me sentir vossas lágrimas desdenhosas,
Tocando o útero de minhas lágrimas manhosas,
Para que fodam a pena que a pena tem de mim,
E me fecundem as veias onde voam mariposas,
Em doces voos carpideiros de choro sem fim,
Asas do não em prisioneiras asas do sim!

Todas as lágrimas são belos presentes,
Olhos de água de falsas penas risonhas,
Onde voam lágrimas de penas enfadonhas,
Entre pingos, insípidos de sal, imerecidos,
Prenda de pena desavergonhada de vergonhas,
Acabando desprezada na pena dos amigos!

Secaram agora todas as lágrimas alheias,
Hipocrisia amiga de simpáticas lágrimas feias,
Quase afogaram minha esquecida beleza,
Chorando desdém sobre minha tristeza!...

Escondam de vós as penas de dor,
Que as lágrimas não demorem,
Mas, por favor,
Por vós, chorem!

Aquelas açucenas brotadas de meu corpo,
Regadas com aliviadas lágrimas de pena,
Ressuscitam o olhar do meu olhar absorto,
Esperança desmedida de uma lágrima pequena,
Que zarpa do olhar daquele abandonado porto,
Navegando a liberdade em tempestade amena!

Escondam os olhos das penas de dor,
Que as lágrimas não demorem,
Mas, por favor,
Por mim,
Antes do fim,
Não chorem!

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terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Amor Roubado



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Vezes há em que dou por mim,
A roubar o Amor que o Amor me deu,
Quero devolver este teu Amor que é meu,
Deixando que mo roubes por teu Amor sem fim,
Para que me dês um tão grande Amor assim,
Assim te dando todo nosso Amor que é teu!

Fosse tanto Amor assim roubado,
Partilhando muito do Amor que é seu,
E mais Amor seria dado!

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segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Dores do Povo


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No silêncio dos mudos prados,
Votos de carneiros desolados,
Fungam a gratidão do poder,
Que ajudaram a eleger;
Olham agora pratos esvaziados,
Por tão cheios de nada para comer,
Ingrato o desprezo a que foram votados,
Nos mesmos pastos que continuam a arder!

Por mais estranho que pareça,
O Povo gosta de cabeçadas na parede,
Para poder queixar-se da cabeça!

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domingo, 23 de janeiro de 2011

Voto de Carneiro



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À frente dos doutos cajados,
Obedecem cabisbaixos os timoratos,
Sem orgulho e por pele de carneiro contaminados,
Vão pastando nos deveres cívicos desacreditados,
Gritando a cidadania da pele dos lobos cordatos,
Nos pastos promovidos por tão pífios ingratos,
Que tanto apelam aos votos acarneirados!

Procuram-se lobos com muita fé,
Para salvar o rebanho dos carneiros, mééé!...

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