terça-feira, 2 de agosto de 2011

Ciúme


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Fixando meus olhos,
Teus olhos vi em meu olhar,
Vendo neles mil pecados meus,
Pecados cegos, não pecados teus,
Quais blasfémias que juras não olvidar,
Ciúme esparzido em lágrimas do pecar,
Desperdício perdido por entre escolhos,
Em searas salgadas de salgados restolhos,
Fome de nosso Pão sideral roubado a Deus,
Fermentado com doçura de paixão diletante,
Delirante tempero de impropério pungente,
Cozinhados em aromas de lume brando,
Poalha apimentada com Amor ardente,
Fidelidade minha que queimas e negas,
Na dança de teu bailado inquietante,
Passos de fogo dados às cegas!...

Tuas delicadas unhas afiadas,
Débeis armas de palavras malditas,
Desafiam as minhas palavras adiadas,
Palavras de silêncio que tu não imitas,
Aliando teimosas certezas apaixonadas,
À incerteza de tuas amantes imaginadas,
Desafias a falsa confissão que tu incitas,
Sensato silêncio meu de tua desdita!...

Minha submissão por ti serena,
Curva-se perante tua raiva pequena,
Que exalando odores de vórtice desejo,
Aguarda paciente a tempestade amena,
Tempestade adivinhada que eu almejo,
Vislumbre desejado num lampejo!..

Meu reflexo reflectindo teu cego Amor,
Impulso que tua investida vai contendo,
Cego ciúme e cegueira de teus tormentos,
No acto das tuas mãos que amaciam a dor,
Despontando sinestesia que vai crescendo,
Enlaças a fome de nossos corpos sedentos,
Olhos gulosos e tão virgens por momentos,
Nossa volúpia salgada de doce ávido sabor,
Fiéis amantes dos nossos pensamentos!...

A libido que de teu Amor vem,
Por mim, tua serena submissão,
Trai tua resistência subjugada,
Desconfiança por ti perdoada,
-E por mim também-
Não resistindo a incontrolável tentação,
De tocar teu corpo e sentir teu coração,
Saboreio teus lábios de veludo excitado,
Néctar sagrado de uma lasciva atracção,
Contagiando teu corpo ansioso e suado,
E penetro meigo em teu corpo sagrado!...

Gozando da cadência enlouquecida,
Por cada forte batida enlouquecendo,
Impiedosa possessão consentida,
Arrepio de alma gémea perdida,
Sublime êxtase de longo momento!...

Fixando teus olhos,
Meus olhos vês em teu olhar,
Olhando meus olhos de mil pecados teus,
Pecados cegos não pecados meus,
Os quais juramos olvidar!...

Olhos perdoados de sorriso alargado,
Adormecem em leito de cúmplice malícia,
Repousando no veludo de Amor renovado!...
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3 comentários:

  1. e.. pela primeira vez não resisto ao destaque:

    "A libido que de teu Amor vem,
    Por mim, tua serena submissão,
    Trai tua resistência subjugada,
    Desconfiança por ti perdoada,
    -E por mim também-"

    belíssimas imagens poeta!!

    Encantada creia-me-

    Um beijinho
    da
    Assiria

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  2. O uniVerso é de acidente, engano, serenidade e erotismo, e assim, “Ciúme” [e perdão] desvela um olhar contemplativo, não raro inocente, resultando num poema que está aquém das aparências de um olhar.

    A denúncia, a grande geradora dos conflitos, consiste no reflexo do olhar [“Teus olhos vi em meu olhar,]. O poema inteiro reproduz com fidelidade uma composição fotográfica. Um click revivido pela tinta poética como uma cena apanhada de surpresa pela câmera de um fotógrafo.

    A metáfora que ilustra a cena principal é o alimento poético d’Alma e os temperos são os argumentos utilizados quando a insegurança surge no relacionamento [“Tuas delicadas unhas afiadas, / Débeis armas de palavras malditas,”]. O ambiente é de desavenças e cobranças. O ‘verso’, entretanto, compreende a importância de manter a serenidade [“Minha submissão por ti serena, / Curva-se perante tua raiva pequena,”], e é impossível não admirar a beleza da poesia, porque não é o tempo o grande conciliador, mas o próprio olhar refletido [“Meu reflexo reflectindo teu cego Amor,”].

    Da desconfiança à confiança, um passo. Da guerra à paz, o abraço. O corpo é a linguagem, mas é o olhar, novamente, quem sela a paz [“Olhos perdoados de sorriso alargado,”].

    E quem nunca sentiu ciúme, que se atreva a ler, no espelho da poesia d’Alma e que seja capaz de se rever num olhar que está além de uma simples contemplação. Um olhar, ainda que eventualmente use olhos escuros [wallpaper], que sempre nos oportuniza senão soluções, alternativas. Verdadeiras lições de vida.


    ¬

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  3. Vim para agradecer a sua visita e o comentário em meu blog e me deparo com um poema fabuloso recheado de metáforas e imagens lindas... onde o ciúmes não alimenta apenas a relação do casal, mas também belos poemas.

    Com certeza voltarei outras vezes.

    Beijo em seu coração.

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