segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Abandonadas




Sentir tua sombra instintiva,
Que minha luz apagada empalidece,
Impele-me à masturbação que acontece,
Numa cruel raiva infectada de leitura passiva,
Só tolerada por minha rejeitada maluqueira viva,
Que do teu indiferente Amor meu desejo padece!...

Sobrevoo velhos declives das antigas histórias benditas,
Busco esquecidas palavras abandonadas que me enganam,
Na forca estranha de entrelaçadas odisseias mal escritas,
Em cordas distorcidas de nossas mentiras restritas,
Cópias das cordas que as verdades esganam,
Escrevendo rabiscos dos quais se ufanam,
As cópias sábias de ignoradas eruditas!...

Meu prazer insatisfeito é incomensurável,
Sempre contínuo e para todo o sempre incompleto,
Meu desespero partilhado é um forte desejo circunspecto,
Perdido entre a memória em carne viva do teu sexo mutável,
E a morte do Amor por mim que em mim é dor insuportável,
Sepultada no orgasmo incompleto de um divórcio discreto!...

Moldo naus apodrecidas com páginas amantes,
Para navegar oceanos de palavras que me afogam,
E me salvam de orgulhosas vergonhas degradantes,
Em cada capítulo inacabado de solidões frustrantes,
Que sobre inconfessáveis troca de solidão dialogam,
Ensaiando prévios monólogos que as palavras rogam,
Aos pés de vivas mágoas de abandonos estonteantes!...

Sou agora uma cópia de palavras prostituídas,
Insinuantes nas esquinas de livros que ninguém lê,
Sou a palavras infectada de minhas estimadas feridas,
Alveolar morfina contrafeita de Afegãs papoilas destruídas,
Só não sei se sou o que não confesso ser da mulher que não se vê,
Por incrustada palavra que na cavidade de minha solidão fica à mercê,
Fechando-me no medo do abandono de abandonadas palavras amigas!...

Voam alvéolas amarelas dos parágrafos descontinuados,
Esvoaçam intermitentes no rasto intermitente dos insectos,
Letras de caça abatidas nas palavras ímpares dos pares directos,
Que se refugiam na pele das palavras com diferentes significados,
Parecendo iguais na descrição das lágrimas de olhares encurralados,
Nos pastos da cabra que há em mim entre ovelhas de negros afectos!...

Continuo masturbando-me entre minha dedicada leitura,
Enquanto procuro o único orgasmo que nunca soube atingir,
Restando-me o prazer inacabado no incógnito final da procura!...
.
.
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2 comentários:

  1. O poema troca de gênero. Um recurso linguístico de objeto de crítica e “Abandonada” ganha a consciência emocional da poesia que se rende ao universo feminino. As palavras, ou os versos, debruçam-se sobre a escrivaninha e escrevem sem cama, e sem prazer. Da busca. E do encontro. Que não é presente, nem futuro. É o passado, que não passando, tem a solidão como companhia.

    Um mergulho, e um corpo, estendido na mesa. Ou no chão. Como meio de transporte, ou via, a poesia tem o poder de me incomodar. Como leitora, mas principalmente como mulher, minhas lembranças são afloradas. Uma prática comum, porque a própria palavra d’Alma já é uma prática, pois através dela, de certo modo, de todo o modo, ela assume o lugar de guardião dessa memória. Mas ao contrário do que antes terminava em luz, ou clímax, agora termina em sensação de incompletude. Ou vazio. Ou ausência. Ou falta.

    A tal chamada solidão.

    E sorrio.

    É verdade que as palavras ficam à margem das idéias. Lugar de solidão e angústia. Mas há o sentimento. Esse, do silêncio. Incompreendido, como todo silêncio, ainda assim, um emissor. Como é verdadeiro o que depreendo da minha leitura: meus sentires.

    Tempo de procura, a busca vai continuar [“Restando-me o prazer inacabado no incógnito final da procura!...”], e um dia quem sabe, não nos encontramos, por aí. Eu e ela.


    ¬

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