quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Polissonografia

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Eléctrodos para lá do cérebro desperto,
Uma teia perfeita no princípio de terminais,
Ciência confidente de inconfidentes sinais,
Suspeita de um complexo futuro incerto,
Sem segredos e de certezas tão perto,
Na incerteza dos diagnósticos fatais!...

Quatro paredes de um branco frio,
Não tão frio no frio branco de uma cor sem cor,
Há no ar Almas orgulhosas conformadas com sua perda de brio,
Desoladas descolorações etéreas descrentes no sal com sabor,
Há uma cor fria que preenche o paladar com um doce vazio,
Pressentem-se correntes de sal a desaguar naquele rio,
Das quatro paredes brancas escorre um branco rigor,
Não tão branco quanto seria de supor!...

A cor tecnica dos olhos é de um verde esperançado,
O Branco é branco particular do aposento,
Já foi público de um público mais cinzento,
A cor de cada eléctrodo tem um fim determinado,
A cor dá cor à tradução de um significado,
Há um secar rápido do tempo,
Em cada terminal fixado,
E deito-me sonolento!...

As camas só dormem enquanto não as acordamos,
São como um colo materno que nos tem com ternura,
Quando se desliga a luz a escuridão é pijama da brancura,
Que nos veste o desejo de sono com que no dia sonhamos,
Cedo se descobre que no rosto da noite tardará a candura,
Essa mesma inocência que na nossa inocência desejamos,
Mas a cama range os dentes por cada volta que damos,
E sentimos nosso sono enredado numa teia de tortura,
Ao qual o sonho dá tréguas enquanto ressonamos,
Despertando os gráficos claros de nossa agrura,
Vigiados por olhos sonolentos de verdes anos!...


Depois de voltas sobre o ranger da cama,
Entre as voltas que me adormeciam a ideia,
A noite não foi palco de qualquer drama,
Nem os eléctrodos revelaram apnéia,
 E lá regresso com uma nova chama,
Vencida que foi mais uma odisseia!...

A meu lado continuarei a ouvir minha esposa dizer:
-Assim não pode ser!!!!!!!...
E adormeço...
 .
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2 comentários:

  1. Fisico-Quimica nunca foi do meu domínio. Talvez pela incerteza e cepticismo que senti, quando um dia, o meu Professor, me garantiu a pés juntos, que a alimentação de uma corrente condutora, poderia ter uma acção química com a ajuda de uma …batata!! O suficiente para nunca mais acreditar no Professor, nem na cadeira...resultado: hoje completamente leiga e a leste dessa ciência
    Pois é. Aqui que ninguém nos ouve, ficava em estado de pânico, quando no Liceu me obrigavam às diversas experiências, na tentativa de observar o efeito Luz. Um pavor! Trocava sempre os pólos e lá se fundia a lâmpada; e lá se ia o brilho do resultado da minha tentativa. A partir daí, deixei de acreditar em aparições. Ou a luz brilha ou não brilha! Todavia entendo das cores, sei diferenciar o branco do cinzento e o cinzento das tardes ou das noites obliquamente nuas, terminais com efeito condutor, afixados nessas esquinas brancas… pelo puro gozo e gosto até, de me sentir deliciadamente anulada p’la luz do meu candeeiro. Esse, que nem me atrevo a mudar a lâmpada, porque sei que não entendo nada dos diagnósticos fatais de uma lâmpada mal enroscada. Em último caso, recorro à luz branca que me invade pela janela…belas essas luzes que luzem, todas vivas e brilhantes como cascatas de diamantes…fico a contemplá-las até adormecerem… gosto quando as lâmpadas adormecem pelas esquinas, brancas e radiosas, como num mundo primordial…
    Perdoa Poeta se divaguei, se sobremodo fugi à temática da Polissonografia, dos iões e dos electrões, das descolorações etéreas ou do efeito das irradiações …mas, tem também o Poeta a liberdade de vaguear…penso que entenderás por isso, este comentário que aqui te deixo…

    T’Abraço e bom fim de semana

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  2. O que antes pertencia à motivação da experiência a ser vivida na busca de um diagnóstico baseado na sintomatologia de “Ressonar”, sem a pretensão defensiva, ou receosa, natural ao paciente às vésperas de um exame, “Polissonografia”, sob o olhar nostálgico de d’Alma, e prudente o bastante, desperta no campo da sensação, do corpo e da expressão artística a importância da teorização racional e me devolve esse olhar às minhas próprias vivências, dissolvendo o medo da realidade que não pode ser negada, ou negligenciada, e deixo-me ser levada pela poesia que me contagia de serenidade.

    E concluo, então, que bom seria se todos aqueles que têm o dom da linguagem poética e soubessem desfrutar desse privilégio nem sempre em benefício próprio, mas talvez, também, em razão de um próximo que o lê, ou o ouve... como o mundo seria mais belo. Ou menos mortal.

    Sua chama, A., é uma luz admirável.


    ¬

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