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Aquela imagem teimosa,
A criança de rosto empoeirado,
Mãos que sacodem terra do pão,
O sacudir antigo da fome receosa,
Aquele olhar envergonhado,
E a palidez da razão!...
Uma lágrima caída no chão,
Outra que se esconde, medrosa,
O ranho sujo pela fome provado,
O insulso
sabor da resignação,
E a palidez silenciosa!...
O prato cheio de fé religiosa,
Na ponta da língua o pai-nosso rezado,
Todas as rezas e o acto de contrição,
O sonhar com a fartura perigosa,
E a palidez do fado!...
O desespero amordaçado,
A mordaça com cores da nação,
O grito pobre de uma criança ranhosa,
Moldura à imagem de um Povo amarrado!...
Chegaram os cravos da revolução,
Logo a seguir ergueu-se o punho cerrado,
Abriu-se a mão que se transformou numa
rosa,
Setas apontavam um céu azul e o ouro da
fartura,
Atrás das costas ficou o mal que nem
sempre dura,
E o peso dos sonhos prometidos,
Dos soníferos cumpridos,
E o fim dos pesadelos da ditadura;
Cravos e mais cravos, por cravos
protegidos,
Rosas e mais rosas entre cravos floridos,
O florescer livre da arte e da cultura,
O princípio de uma aventura,
E os manifestos permitidos…
O futuro…
O futuro…
A velocidade e o muro,
O fim que o cravo não previu,
E seu esborrachar prematuro!...
Esta imagem que teima,
De crianças sem pais nem abrigo,
A fome da democracia que queima,
Cravos que a ditadura trouxe consigo!...
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