quinta-feira, 12 de abril de 2012

Vamos?!...

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Vamos queimar o Abril dos cravos aldrabões,
Aspirar  as cinzas do nosso futuro que ardeu,
     Lembras-te da Liberdade que nos prometeu?!...
 Vamos agradecer aos geniais crânios sabichões,
 Mastigá-los com molares de nossas desilusões,
 Há ossos debaixo da carne que alguém comeu,
Vamos reduzir a cinzas os impérios de ladrões,
    E reaver o que é nosso desse muito que é teu!...

Vamos queimar um velho cavaco já queimado,
Incendiá-lo com os espinhos secos dos silvados,
Aproveitemos para assar um coelho subornado,
Vamos temperá-lo com a fome dos atraiçoados,
Afogar as mentiras em vinho d’alhos enfastiados,
Até que o cheiro dos cravos se tenha evaporado,
    E o silêncio das armas de Abril se tenha calado!...

Vamos lá saborear as cinzas quentes dos coelhos,
Dar aos cães vadios a carne com sabor a traição,
Ensinar princípios de Humanidade aos rapazelhos,
Vamos reduzir a cinzas os presidenciais conselhos,
Dobrar-lhes seus joelhos sobre as mesas sem pão,
Mostrar-lhes apenas a metade de tanta ingratidão,
 Vamos quadricular-lhes as rótulas lisas dos joelhos,
    Fazê-los engolir o pó das tábuas de nosso caixão!...

Para onde vão nossos filhos que tanto amamos?!...
Emigram assim de braços confiados à Esperança,
À espera de encontrar noutro País uma lembrança,
Deixada cá para trás na tristeza com que ficamos,
Como se os carinhos do País que deles lembramos,
    Sejam apenas cinzas que nos impelem à vingança?!...

*

Há quem não queira ver,
     Um velho cavaco a arder?!...
   Vamos?!...
Dar-lhe a oportunidade,
Do sentido da utilidade,
Ensinar-lhe o que fazer,
Como assar com vontade,
Um coelho de meia idade,
    Cego por tanto poder!...

Depois do coelho comido,
O vento do povo leva as cinzas de cavaco,
     E substituímos os cravos que se têm escondido!...
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2 comentários:

  1. Perfeito: nos dias que correm h+a casa vez mais "gajos" a querer queimar os cravos de abril.
    Eu endo a avisar h+á que tempos...querem calar-nos, querem voltar ao passado...ninguém me ouve...
    Bj

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  2. Qualquer coisa que se diga sobre d’Alma, ainda que o cubra de elogios e que use de um vocabulário que vá do elementar ao requintado, ainda assim, nada fará justiça àquilo que ele de fato representa, e tanto à sociedade contemporânea de seu país, com poemas que contam a história de Portugal, como ao conhecimento, obrigatório, favorecido de crescimento interior, a todos que o lêem.

    Seus poemas comportam a força e a coragem de um homem que sentiu perfeitamente o ambiente de seu tempo, e instigando a reflexão, através da opinião mais realista possível, indicam um caminho. De saída, de luta e de vida. Sem deixar uma fenda sequer, d’Alma é completo. Inteiro.

    [...]


    Manifestando repulsa diante do contexto sociopolítico de Portugal, “Vamos?!...” serve-nos de prato principal a mais pura poesia, mas não é um poema-convite para um banquete de confraternização, é uma convocação cívica! Mais que denúncia, seus versos ecoam uma poesia temperada de protesto e de esperança, uma poesia de amor à terra, às suas raízes e à preservação de sua cultura.

    Um condimento decisivo como afirmação de caráter e índole, é pelos versos e pelo talento, nutrindo com sensibilidade e inteligência, que a poesia se revela na tranquilidade da consciência, mais que um ideal de beleza e de harmonia, entre tantos sabores, é pela nutrição da própria humanidade.

    E quanto mais tempero d’Alma adiciona à poesia, despertando um paladar de justiça, mais fomenta o apetite ao leitor. E senão for do estômago a saciedade, é da alma, na urgência de que se façam POETAS com letras maiúsculas.


    ¬

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