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Há sempre uma pequena aldeia,
Um pequeno espaço entre o tempo e o
tempo,
Há sempre o tempo que permanece jovem na
ideia,
E o outro tempo!...
O momento,
E a juventude que serpenteia,
Um pouco de sinuosa odisseia,
E por mais que se tente,
Faz-se o caminho em frente,
Como se fez o fazer do continuar,
O que fica e continua a ficar,
Folhas que caem suavemente,
Fazendo-se dimensão sem o pensar,
No longo limiar do caminho!...
Curtos os passos de um rapazinho,
Fraquinho e obra de um milagre qualquer,
O que se quiser e Deus que nos queira com
seu carinho,
Só um bocadinho da sorte do merecer o amor
que se quer,
E Merecer o que puder para ter Deus como
vizinho!...
Há uma ideia muito vaga do leite,
As ovelhas sem pasto continuam a vaguear,
As ovelhas sem pasto continuam a vaguear,
E às cabras sempre fora dado o privilégio
de pastar
Tão forte foi a crendice milagrosas nas
cruzes de azeite,
E a barriga benzida que sempre voltava a
inchar;
Benditas cabras e seu leite para me
alimentar…
Há uma certa nostalgia na cor dos velhos
pastos,
Nos campos brancos a desvanecerem-se na
mansidão,
E no silêncio da saudade daqueles tempos meio
gastos,
Como… suaves espelhos transparentes e
vastos,
Onde me perco numa imagem de imensidão,
E busco perder-me nessa nova dimensão,
Até reflectir-me e acabar de rastos…
Voltar a beber aquele leite de cabra, eu pudera,
Voltar a beber aquele leite de cabra, eu pudera,
Carregar aquelas cruzes de azeite, quem
me dera,
E sentir desinchar os anos modernos do
remédio para tudo!...
Sinto a culpa do tempo neste olhar barrigudo,
Sinto a culpa do tempo neste olhar barrigudo,
Fosse o que fosse que o tempo quisera,
Os caminhos forrados de veludo,
Tapetes floridos de Primavera,
Com parte disso e, contudo,
Já não é isso que era!...
Aquela coragem de minha Mãe Valentina,
A aldeia e a gente de quem nunca me despedi,
O adeus adiado à escola, princípio do que aprendi,
Como aprender depressa e fazer a quarta na terceira,
E o fim das viagens com a essa professora verdadeira,
Tão verdadeira quanto suas belíssimas pernas que vi!...
Pai!...
Meu Pai e sua morte,
Meu Pai e sua morte,
A ironia do azar e da sorte,
A partida à pressa de quem não vai,
De quem acaba por ir e da aldeia não sai,
O ter que ser da mudança e a resignação forte,
O destino infalível de quem se levanta quando cai!...
A chegada ao Bairro da Ponte,
As águas do rio e a água da fonte,
A própria fonte e um imediato apego,
Fronteiras do tempo e só depois Lamego,
A proximidade do longínquo horizonte,
O limite da aldeia e do seu sossego,
A descida pela subida do monte…
Como o tempo indiferente,
A indiferença das horas e dos dias,
A escalada involuntária até à nascente,
Por entre dedos, o escoar das águas evidente,
Sonolentas águas mornas e o arrepio de águas frias,
E a dúvida se aquela água não serei eu!...
Escoado em queda livre com os amigos,
Escoado em queda livre com os amigos,
Sem pensar naquilo que nos aconteceu,
Enquanto caímos entre velhos castigos,
A dádiva do tempo que Deus nos deu!...
Debaixo da ponte a água continua a
correr,
Talvez as pedras saibam do aniversário
dos caudais,
A força que nos leva barquitos de papel
cheios de prazer;
Corremos para ambos os lados da ponte que
nos viu crescer,
E apostamos na rapidez do nosso barquito
do qual gostamos mais,
A montante corre forte a água que debaixo
da ponte se vai esconder,
Esconde o barquito de papel que por
momentos não podemos ver,
Voltamos
ao outro lado da ponte e não vislumbramos um cais!...
E lá vão eles, cada um carregado com os
nossos anos,
Rio abaixo, saudado por bogas, trutas e
bordais,
Deixando a saudade que cada vez pesa
mais,
No
coração destes barquitos humanos!...
Olhamo-nos e ainda nos custa acreditar,
Sentimos tão perto as picardias de nossa
inocência,
O tempo ensinou-nos a conviver com os
anos de paciência,
E com os amigos que a distância entre
margens fez separar;
Como distante era o juízo do nosso
inexperiente olhar,
Sob os que marchavam numa fúnebre
agência,
Aqueles velhos quarentões,
Muito velhos sem ilusões…
Somos tão Homens,
Cinquentões,
E somos tão Jovens!!!...
Outras margens se encontraram,
Sabia das águas felizes no fim do
inverno,
E da felicidade que os rios da vida
trouxeram,
Há sempre uma Mulher a verter um sorriso materno,
E o apelo da outra corrente que a margens
de amor fizeram,
Mulher, essa margem e rio que as águas do
destino quiseram,
Margens encontradas no prazer de um bendito
inferno,
E
os filhos, esses barquitos que homens se fizeram,
Com as folhas que navegam no meu caderno!..
Hoje… entrego-me a uma certa nostalgia,
Os espelhos estão cada vez mais transparentes,
Vejo-me na imagem de todas as imagens aparentes,
E no reflexo concebível de uma espelhada Poesia,
Que me faz igual a tantos 50 anos diferentes!...
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