quarta-feira, 13 de maio de 2015

Exclusão do Olhar


.
.
.

Dentro de si,
O sangue corre fora de ti,
Arrefece os caminhos para o peito,
Excluíste do teu coração, o calor e o respeito,
Exclusão que dentro dos excluídos eu vi,
     Incluída fora do pensamento desfeito!...

Vejo-te viver sem qualquer razão,
Respiras caminhos que não sentes,
Vejo-te viver em anuente exclusão,
Há um caminho ao qual tu mentes,
Vejo-te viver sem coração!...

Só vês caminhos recalcados,
E te decalcas em passos perdidos,
Apenas consegues ver objectivos repetidos,
E antes de chegares aos milagres imaginados,
Vais perder-te entre vivos caminhos truncados,
Onde a esperança dos teus olhos desfalecidos,
Pela esperança dos seixos da vida cegados,
    Acaba entre sonhos nunca cumpridos!...

Nunca observaste a vida nos caminhos,
A meta brilhava com uma intensidade maior,
Não viste a exclusão dos que caminhavam sozinhos,
Nunca te deste conta de um caminho melhor,
De todos os caminhos escolheste o pior,
   Caminhar sem sentires os espinhos,
       Nem a flor regada com o teu suor!...

As velas iluminam a triste cegueira,
Os olhos vão derretendo à vista das velas,
Há uma luz divina que, de muito longe, se abeira,
Entre a luz dos olhos e a da alma há uma fronteira,
Ninguém cruza o limite de suas lágrimas singelas,
Enquanto ardem os pecados em cada uma delas,
A cera vai cobrindo uma arrefecida vida inteira,
      Que se derrete à luz das coisas mais belas!...

Um sorriso cheio de luz,
Mães acolhedoras à luz do dia,
A luz que ilumina o caminho da cruz,
Os passos, as Mães, a caminhada macia,
A humildade que não se enfastia,
O Pai e o Pão!...
A partilha e a razão,
O amor que não se esvazia,
Todos os caminhos do coração,
O sangue livre, de uma vida sadia,
Todas as luzes sem ilusão,
A luz nunca tardia,
     Nunca a exclusão!...

    


 .
.
.
                                                                                 



sábado, 9 de maio de 2015

51

.
.
.

…aos 51, deixo de fazer anos,
Já fiz os anos que tinha a fazer,
Dos velhos, restam novos planos,
É tempo de reconhecer os enganos,
E os velhos pecados não vou esquecer,
Dos anos feitos não me vou esconder,
Agora serei mais um dos humanos,
   Que só fará anos… até morrer!...
.
.
.


segunda-feira, 4 de maio de 2015

Soneto à Portuguesa (Soneto às Putas Honradas)

.
.
.
Muitas mulheres honradas,
Que sempre desejaram ser putas,
Morreram de desejo, coitadas,
    Com as saias muito curtas!...

Nunca desejaram ser fodidas,
E não sabem se alguém as fodeu,
Foderam a honra de muitas vidas,
   E o homem que filhos lhes deu!...

Anoitecem putas sem o saber,
Dentro delas, amanhecem por fora,
 Sem nunca chegarem a amanhecer;

São, de todos os dias, a aurora,
Putas como sempre quiseram ser,
    As amanhecidas putas, d’agora!...
.
.
.


sexta-feira, 1 de maio de 2015

Colheita Perdida


.
.
.
Mordeste a terra deixada ao abandono,
Cemitério onde enterraste teus dentes,
Sonhavas com trabalho, esse teu dono,
O pesadelo de perdê-lo tirou-te o sono,
     Hoje não dormes por muito que tentes!...

Mordeste a terra alheia, tão fértil e pura,
Viste teus dentes caírem a cada dentada,
Mastigaste teu árduo suor da tua agrura,
Semeaste-te em campos de escravatura,
     Colhes a tua raiva dentro de ti enterrada!...

Hoje, ainda vês teus campos reverdecer,
Nos olhos que ainda procuram abastança,
Olhas teu prato onde nada há para comer,
    Vês a desilusão nos pratos da tua balança!...

Semeaste uma desenterrada lembrança,
Teu olhar ainda semeia o que teve de ser,
Esqueceste onde semeaste a esperança,
    Ai, se soubesses onde a esperança colher!...
.
.
.

   

domingo, 19 de abril de 2015

Despertar de uma Flor Enganada (A Revolta)








.
.
.

Pobre pálido idealista,
Com teu verde no chão,
Vermelho até ao coração,
Minha linda flor imprevista,
Intuíram-te numa ideia altruísta,
Para que fosses a flor de uma nação,
O jardim à beira mar sentiu a tua desaparição,
Lembra-se de seres semeada num bolso capitalista,
    E de ver-te crescer nas esnobes lapelas de um ladrão!...
Que fizeram de ti, minha pobre flor?!...
Semearam-te,
Ajudaram-te a crescer na ilusão de um mar imenso de amor,
Convenceram-te que aos cais das despedidas, não voltaria a dor,
   E, depois do idílio, desengano após desengano, foram partindo,
Os poucos que aos poucos foram ficando… violaram-te!!!...
Da tua dignidade violada, os violadores foram rindo,
Ainda lhes imploraste: - Por favor!!...
Tua esperança foi diminuindo,
Amordaçaram-te,
Tua voz foi-se calando a mando do censor,
Os revolucionários libertadores enganaram-te,
E sentiste que se desvanecia o teu alegre rubor,
Ignoraram-te,
Maltrataram-te,
Espezinharam-te,
 Foste abandonada no canto mais austero da Democracia,
Foste murchando com a esperança murchando ao teu redor,
Sentiste que a ilusão da terra lavrada, outrora fértil, esmorecia,
E questionas-te, agora revolucionada pelo teu verde pudor,
Sobre teu caule revolucionário que há muito não se via,
Olhas o jardim onde não estás e só vês a maioria,
Jardins cheios de eleitas maiorias sem valor,
Jardins, por ti eleitos, de eleita tirania,
   Que te fazem vermelho de rancor!...
Uma indescritível história de desamor,
E se palavras houvesse para o descrever,
A vergonha nãos as deixaria dizer,
   E ali ficam contigo, pobre flor!...
Que fizeram de ti?!...
Amaram-te,
Ilustraram-te,
Coloriram-te e serviram-se de ti,
Decoraram o concreto das cortinas de murais,
Deram-te um inesperado emprego e desempregaram-te,
   E as belas cores da igualdade, não voltaram, jamais…
   Abandonaram-te!...
Que quiseram eles de ti?!...
Deram-te à terra e desenterraram-te,
E nem sequer um pingo de chuva aparece,
Nem a chuva, nem um só amigo,
Que partilhe contigo,
A dignidade que uma flor do Povo merece!...
O que fizeram de ti, minha revolucionária flor,
Que, em ti, a revolução floresce,
Liberta-se e cresce?!...
Ignorando a semente, enterraram-te,
Enterrado vivo na terra quase morta, o desconchavo,
Renasces revolução nesta democracia que apodrece,
Revolucionaram-te...
Sem apelo nem agravo,
    Meu vermelho e verde Cravo!...
Despertaram-te!...
.
.
.

  

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Coisas e Tal... do Fado


.
.
.
Cantas o que eu canto tão mal,
Com dor na voz de quem canta,
Salgas as vozes do mar com sal,
O mar dói na tua voz, coisa e tal,
    É a voz da tua dor de garganta!...

Deixo navegar esta minha voz,
Nas tuas ondas de mar salgado,
Há este grande rio em todos nós,
Que leva o nosso canto até à foz,
    Coisas e tal do nosso triste fado!...

Canto mal como quem canta,
Canto muito mal mas sou feliz,
Dói-me a voz que não encanta,
Calo a voz que não se espanta,
  Com a tua voz, como quem diz,
     Que diz ser só dor de garganta!...

Continuo eu neste triste canto,
A cantar as dores do nosso mar,
E o doce sal, para meu espanto,
Coisa e tal, cantando, entretanto,
Canta as lágrimas que vai salgar,
   Para fazer doce o nosso pranto!...

Minha voz que continua a doer,
Não se cala à voz que se adianta,
Canta o triste fado sem o saber,
E antes que me mandem foder,
   Digo que é só dor de garganta!...

É grande a dor dos maus fadistas,
Já não cantam as dores de Portugal
Por tanto doer não os levam a mal,
Sentem o fado para dar nas vistas,
    Cantam alheios à dor e coisa e tal!...

Coisa e tal, ponho-me a pensar,
Se eu não podia cantar o fado,
Mesmo sem saber cantar,
  E nunca ter cantado!...
.
.
.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Leilão dos Corpos


.
.
.
O corpo tem um preço incerto,
Tão certo quanto a incerteza do seu valor,
Na guerra da carne, vale tudo menos o amor,
A origem das cinzas, está das cinzas muito perto;
Alguns corpos são leiloados no deserto,
Evaporam-se em lanços de calor,
    E gelam de corpo aberto!...

*

Retraem-se para o seu próprio desvão,
Trastes dos que querem que trastes sejam,
Leiloam-se no segredo do seu próprio pregão,
Vendem os dias aos que dizem que mais lhes dão,
Uns fogem sozinhos antes que outros os vejam,
Compram o que vendem com a sua solidão!...

Indecisos entre qual das mortes escolher,
Inquietam-se muito apressados e correm,
Escolhem ser lindas estrelas do anoitecer,
Entregam o corpo ao sol para não morrer,
Sentem os gélidos suores que escorrem,
O pesadelo do que não queriam ser,
Fogem da morte e morrem!...
.
.
.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Lírios do Desejo


.
.
.
A textura de natural beleza,
Frescura no desejo implícito,
Eflúvio de uma florida leveza,
A tentação na carne indefesa,
A inocência do prazer solícito,
Os beijos em flor da natureza,
e…
A primavera do invite explícito,
Ao férvido olhar do desejo vivo,
O olhar, cumplicidade e indução,
A flor, o pólen proibido,
 O inocente motivo,
     E o tesão!...
As essências e o coração,
O “feeling” expressivo,
A denunciada expressão,
O aguardar exaustivo,
A calma submissão,
Aveludada rendição,
O cilício contemplativo...
Desvanece-se a Primavera,
    Esmorece a ilusão!...

Há um lírio que já não é o que era,
Nada resta do que poderia ter sido,
Á brancura da alma, lírios lhe dera,
Lírios brancos, a um lírio oferecido,
Lírio que andou sempre escondido,
    Nos verdes desejos de Primavera!...
.
.
.