sexta-feira, 5 de abril de 2013

Prisões Semelhantes

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Circula um rumor inocente,
Em prisões cheias de liberdade,
Que há uma liberdade diferente,
Na justiça algemada de tanta gente,
Pouco se importando com a igualdade,
De ver a justiça condenar a verdade,
Do mesmo modo que livremente,
    Serve a injustiça com lealdade!...



Á liberdade aparente,
Esconde-se a semelhança,
Entre a liberdade vigente,
E seu ponto final iminente,
   Já presa por insegurança!...

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terça-feira, 2 de abril de 2013

Contas

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Não contava encontrar,
O velho contador;
Em tempos,
Contava estórias de encantar,
Contas de rico teor,
Sobre contas de rico senhor,
     Contas que dele sabia contar!...

-Olá, amigo contador,
Que contas,
Amigo sonhador?...
Que contas,
Sobre tuas ideias tontas,
    Com que foste sonhando?...

Com uma triste desilusão,
Baixou a cabeça e acenou que não,
Há anos que deixara de sonhar,
 E foi contando:
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 -Conto que já nada tenho para contar,
Já não conto os anos que passam,
Não conto os que estão por passar,
Faço de conta que conto,
E conto que conto,
E volto a contar,
Conto as horas que deixei de contar,
     Conto que parei de sonhar;
Já ninguém me tem em conta,
Dão-me um desconto,
E volto a contar,
Só não conto,
Nem desconto,
As contas que ficaram por pagar!...
E conto mais:
Conto que olho,
E volto a olhar,
Conto que vejo um pote,
Cheio do frio que ficou,
Sobre cinzas que a fome não levou,
E volto a contar,
Conto que raspo-lhe o fundo,
Todo raspado pelos donos do mundo,
E volto a raspar,
Conto que conto e volto a contar,
Conto que os olhos de um filhote,
Raspados no fundo do pote,
Me contam ser olhos de fome,
E volto a contar  a tristeza no olhar,
De quem já nada come,
Conto que vejo olhos que choram,
 E voltam a chorar,
Conto que já pouco conto,
E nada mais quero contar,
E conto que conto,
  E volto a contar!...
Conto com quem não me conta,
Que ainda conta comigo para contar,
Conto com quem não me paga a conta,
Essa conta que não conta,
Para as contas que não posso pagar,
 E continuo a contar,
Conto que conto,
Que não ter que contar,
   É um conto que me vai matar!...

E conto e volto a contar,
Conto que não contem comigo,
Porque nem comigo eu conto,
   Para as minhas contas pagar!...

E conto que conto,
  E volto a contar…
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segunda-feira, 1 de abril de 2013

Furúnculos e homúnculos





Porque hoje é dia de incontinentes verbais,
E de todos aqueles que por insanidades mentais,
Encontram em cada dia novas formas de mentir,
Aqui lhes dedico algo que não vem nos manuais,
Se bem que não seja espectável fazê-los refletir!...
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Era um saco cheio de nauseabundos dislates,
A pele tecia-se numa asquerosa serapilheira,
Duas ervilhas já podres em vez dos tomates,
Eram as partes de seus disformes combates,
Forma abjeta, a daquela merda tão rasteira,
Abandonado entre o vómito e a estrumeira,
Tortuosa mente de ressabiados disparates,
    Torturado pelo cheiro da própria asneira!...

Aquele saco cheio de merda tão repelente,
Dizia-se homem e mulher, só não era gente,
De quando em vez,
Tresandando a estupidez,
Despia a serapilheira, o infeliz travestido,
E sua mente de sua demente merda já esquecido,
Com o seu coração imundo desfilava sordidamente,
Rastejando em sua forma de ser distorcido,
Como coisa abstrata que já não sente,
A diarreia em que, inevitavelmente,
   Já se desfez, levando-se consigo!...
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Aquele saco de pus virulento,
Dizia-se mulher abandonada,
Deixada ao abandono… sim,
Por não merecer ser amada,
É seu o miserável tormento,
Disseminando ódio sem fim,
Contra as palavras do vento,
O culpado da sorte infetada,
Do seu coração peçonhento,
   Que mais valia estar cheio de nada!...

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Esta é a estória possível sobre uns podres furúnculos,
Á beirinha de um ataque de nervos prestes a rebentar,
Tamanha dor e tais intumescimentos dão que pensar,
E dão que pensar os amolecimentos dos homúnculos,
     Que, quer rebentem ou não, mais vale não os cheirar!...

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