quinta-feira, 5 de maio de 2011

Inveja


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-Ai, meu Deus, que é isto?!...
Irreconhecível mistério que eu conheço,
Tão igual plágio da cópia que nunca vi,
Mais poderoso do que um falso Cristo!...

Infâmia vil de um tropeço,
Não reconhecendo algo em si,
Tropeça em todas as almas,
E, vegetando o coitado aqui,
Cai fraco sobre o Destino,
Onde caminhando nas calmas,
Sente o torpe olhar alcalino,
Do adeus, da imediata Saudade;
Arrepende-se do nada e do tudo,
Não compreendendo que na verdade,
O Universo num firme grito mudo,
Ordenou que dele houvesse piedade!...

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segunda-feira, 2 de maio de 2011

"Sopeira"


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“…de qualquer maneira,
Por mais linda que seja,
Para a patroa feia e sua inveja,
Serei sempre uma porca rameira,
Pano de chão de língua na soleira,
Serei sempre uma pobre sopeira!...

Criadinha de servir,
Ao servir como ninguém,
Servindo-se no papel de mãe,
Escreve o trabalho sem um ai,
Livro que esconde seu sentir,
À patroa rica que há-de vir,
Contratá-la com desdém,
Do qual não se abstrai,
De encontrar mais um pai,
Para mais um filho que vai parir,
Irmão de outros que ao mesmo não sai!...

…de qualquer maneira,
Pago pelo apagado calor,
De mais um casal sem amor,
Frio rescaldo de fria fogueira,
Que me queima naquela asneira,
De ser prazer em vez de dor;
De qualquer maneira,
Serei sempre uma Sopeira!... “
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sábado, 30 de abril de 2011

O Trabalhador


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Trabalhador no trabalho fincado,
Calos de insónia na noite perdida,
Amealhador ganancioso de riqueza,
Obsessão que o passa ao lado da vida,
Febril medo de ignorância incontida,
Avarento de miserável pobreza!...

Trabalhou com afinco viciado,
Em toda uma vida sem descanso,
Não adivinhando seu leito de corno manso,
Agonia insensível de um homem enganado,
Por causa de seu escravo corpo tão cansado,
Não arrefece a cama de marido atraiçoado!...

Segou mil searas infecundas,
Por cada seara fez mil vencilhos,
Com que atou a fome dos seus filhos,
Míngua de pão em cicatrizes profundas!...

Trabalhou o louco com a loucura do medo,
Promessa de ouro e de escravo prometido,
Trabalhador à morte para sempre agradecido,
Propriedade da morte que lhe aponta o dedo,
Julgando o condenado a um alienado degredo,
Escravo culpado por ele mesmo vencido!...

Nas suplicias despedidas frementes,
Brama o vento das searas revoltadas,
Delírio febril por mil espigas roubadas,
Por mil negros corvos pertinentes!...

Em seara alguma ficou seu nome,
Nem ócio algum morreu de fome!...
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quarta-feira, 27 de abril de 2011

Pólvora à Mesa

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De um prato ladeiro,
Escorrem olhos de fome,
Sorvem-se os cacos sem nome,
Cheira a pólvora de um tiro certeiro,
Engole-se a derradeira vergonha por inteiro,
Mastiga-se a consciência com ódio que consome!...

Todos os Homens são Almas de bem,
Todas as mulheres são anjos imperfeitos,
Os sonhos acordados são corações desfeitos,
São insónias servidas à mesa por alguém,
Fome adormecida na cama de ninguém,
Um azedo sabor servido por eleitos!...
Esposas Amadas são anjos perfeitos,
E os Filhos também!...

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segunda-feira, 25 de abril de 2011

25.ABR.74-Lesa-pátria


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Onde está o Pão prometido?...
Nos bolsos virados do avesso escasseiam as migalhas,
Restos da grande broa bem à vista no bandulho da cultura,
Gorda revolução doutorada de Abril vencedora de mil batalhas,
Até estiveram presos, os coitados, santos mártires da ditadura!...
Quem dá mais pelo registo de uma falsa prisão e tortura?...
Querem melhor símbolo de patriotismo com castigo?!...

Onde está o Pão prometido?...
Os advogados prometeram transformar os cravos em Pão de fartura,
Empanturrando a ignorância com estrangeiro Pão fresquinho da fornalha,
Só faltava a televisão conveniente e a imprensa que ao poder não falha,
Mas depressa se arranjaram abraços entre a autoridade e a ternura,
E das diferentes ideologias extremas nasceram golpes de cintura,
Porque o ouro bem guardado seria prémio vitalício da batalha,
Ora, como a ração é de quem a come e não de quem a talha,
Aqui temos um Portugal de heróis mórbidos de gordura,
Enquanto o Povo definha por esta história de canalha!...

Onde está o Pão prometido?...
Mais de trinta anos de filhos e enteados,
Governados por sucessão,
Bem seguros pela força da Social Comunicação,
Ao serviço dos desejos sagrados,
No regime dos prosélitos apoiados,
Porque interessa é lembrar o regime antigo,
Continuando a prometer o Pão prometido,
Nem que seja em versos por desertores versados,
Como tantos outros à mentira de um passado poupados!...

Onde está o Portugal que nos prometeram?...
Na pança daqueles que a carne do Povo comeram,
Ou nos bolsos dos mesmos, forrados com o ouro do ditador inimigo,
O mesmo que lhes justificou o abrigo,
Nos palácios oficiais, provando a História que não mereceram?...
Hei, grandes heróis que os carneiros elegeram,
Onde está o Pão prometido?!...

Foi este o 25 de Abril que nasceu para salvar Portugal,
Ou apenas serviu para engordar estes doutos senhores?!...
Os mesmos justiceiros heróis que o País devia levar a Tribunal,
Por serem pais da Democracia prostituída que pariu tais estupores?!...

Hei, onde está a igualdade prometida,
Neste Portugal de Justiça falida?...
Sim, ó gordo ladrão, falo contigo:
-Onde está o Pão prometido?...
Quando vais devolver-nos a Vida?...
Pois é, perdeste o teu Portugal antigo,
Deixaste o Portugal moderno sem abrigo,
E, por tão Lesa-pátria, uma dívida suicida!...

Diz-me, amigo…
Onde está o Pão prometido?...
Talvez no luto de uma luta perdida,
Conquistado a um Povo vencido,
Que chora a Igualdade prometida,
Na promessa previamente urdida,
E quebrada a um Povo perdido!...

Por caridade, amigo, diz-me:
-Onde está o Pão prometido?!...

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domingo, 24 de abril de 2011

Páscoa


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Amanheceu!...
Depois de tempestade tão sangrenta,
Da Cruz açoitada com palavras de fel e vinagre,
Celebra-se o prodígio da Vida em vez da tormenta,
Dada à luz pela Esperança de uma Divina placenta,
Alimentada Luz ao redentor de jubiloso Milagre!...

Por nós passa este Sol nem sempre visto,
Deixando-nos a esperança do milagre previsto,
A Luz,
Ressuscitada da Cruz,
Este calor meigo do Sol de Cristo,
Este crer misto,
Que reduz,
O peso de nossa Cruz!...
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quarta-feira, 20 de abril de 2011

o Homem

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Todos os dedos da Humanidade são poucos,
Bastando-se num envergonhado resultado final,
Na conta perdida do número de candidatos a Judas,
Descrentes espoliados por pobres crentes loucos,
Vendendo sede em unguentos antigos de fel e sal,
Pérfido néctar servido em acusadoras palavras mudas,
Dogma instituído na sodomia de sagradas fugas,
Forja de cravos peregrinos na cruz sacrificial!...

O Homem!...
Que pelo homem foi atraiçoado,
Pecado eterno que a ignorância corrompeu,
Traição eterna que o Homem não mereceu,
Arrependimento fatal do homem enforcado,
Trinta dinheiros suicidas que o homem pagou,
Ao homem fraco que o Homem atraiçoou,
Traidor amigo, pelo Homem perdoado,
Perdão que sua morte o homem beijou!...

Todo o peso da culpa sobre sua inocência,
Madeiro pesando o sofrimento dos nossos pecados,
Leve pela oferta de Amor aos pecadores perdoados,
Nada pesando na entrega de sua sagrada consciência!...

-Pai!...
Rezou,
-Perdoa-lhes que eles não sabem o que fazem!...
E à Via-sacra se entregou!

Monta-se o espectáculo e cobram-se ingressos,
Entre o Céu e a Terra aposta-se na crueldade dos cravos,
Acreditar na Justiça da bondade é coragem dos bravos,
Exibe-se o sofrimento de Cristo em sorvos de excessos,
Embriagando os pobres espíritos pela maldade possessos,
A entrada é grátis e só à saída se pagam os pecados!...

Pregado na Cruz dos nossos olhos envergonhados,
Ouvimos nossa vergonha em actos de contrição confessos:

-Pai, entrego-me em tuas mãos,
Exalou o Homem Justo perante o olhar fariseu;
-Está tudo consumado!
E com estas Palavras… morreu!...

Lavam as mãos bem cuidadas os Pilatos,
Em escravas bocetas de epístolas sagradas,
Que sangram das jovens mulheres condenadas,
Marcadas pela cruz pesada de funestos actos,
Por corroídos cravos de luxúria penetradas,
Trespassando carne infecta de úteros ingratos,
Oferecidos ao vício de vergonhosos tratos!


Em cada homem há um triste dom,
Vender a Alma aos prazeres do inferno,
Fugindo ao prazer limpo do prazer eterno,
Crucificar a salvação do Homem bom!...

O Homem lá continua sangrando na Cruz,
Crucificado pelos cravos hipócritas de nossa Luz!...


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segunda-feira, 18 de abril de 2011

Vespa


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Há muita cinta fina,
No papelão do vespeiro,
Volátil verdade no nevoeiro,
Volúvel vespa de dúvida divina,
Envolta por uma diáfana neblina,
Que envolve o corpo verdadeiro!...

Nessa luz de opaca cintura,
Esconde um malogro passageiro,
Fechando os olhos com difusa loucura,
Acumulada na transparente gordura,
Do doentio julgamento sobranceiro,
Obeso julgar de tão pantomineiro,
Infeliz por tamanha agrura!...

Ela é um ele que se mistura,
 No ele de ser ela sem o ser,
Falsa medida de uma figura,
Esmagada sob a sua tortura,
Que mais do que o parecer,
É o nada que a vai suceder,
No vazio de sua ventura!...

Uma picada é desgosto enorme,
É inchaço certo sobejo de fartura,
Encoberto pela verdade disforme!...


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sábado, 16 de abril de 2011

...do Peito

A exaltação emanada do meu peito,
É Poema de liberdade que eu canto,
Melodia aconchegada em teu espanto,
Como se o Verso fosse inverso perfeito,
Eco das metáforas com as quais me deito,
Poesia que te desperta quando me levanto!...

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quinta-feira, 14 de abril de 2011

O(s) Mentiroso(s)

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Concorrendo-lhe nas veias o vício da batota,
Convenceu verdades e mentiras que encontrou,
Com invencionice que do seu sangue se apropriou,
Circula na falta de vergonha que nunca se esgota,
O sangue contaminado da espécie que o idolatrou,
Enredada culpa em patranhas para evitar a derrota,
Com desfaçatez flexível de uma corrupta cambalhota,
Vestindo, agora, a pele dos carneiros que enganou!

A mentira é uma verdade não encontrada,
Que se esconde nas palavras de um mentiroso,
É compulsiva a lata da vergonha desgovernada,
Deste perigoso doente, por incurável, insidioso,
Pronto para mentir à própria mentira descarada,
Roubando vãs promessas a um povo preguiçoso,
Para lhas devolver em verdades de acto doloso;
São tão generosas suas verdades quando mente,
Confundindo-se naquela toleima sempre crente,
Da desonra comprada com imposto criminoso!...

Há um verme mais decente,
À espera de um cadáver verdadeiro,
Aguardando o seu fiel companheiro,
Um reles corrupto por demais demente,
Que enterrou um iludido País jacente,
Deixando-o sem obra nem dinheiro!...

Porque…
Há cadáveres que pelos vermes lutam,
Entregando-se vivos de corpo inteiro,
Aos vermes que cadáveres disputam?!...
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