sábado, 28 de janeiro de 2017

Fria Desinspiração




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Voltou a desinspiração,
Acabaram-se a tinta e as cores,
Qual seria a cor de minha emoção?!...
Talvez de um leve vermelho sem dores,
Cor de carbono, puro de diamantes valores,
Gás, talvez, incolor por qualquer razão,
Inodoro e vital, ausente de sabores,
    Essencial à palavra e respiração!...

Voltou a indiferente vontade e o vazio,
Fim de janeiro, mimosas sem florescer,
Á minha volta todos se queixam do frio,
Ai, se conseguisse imaginar um arrepio,
Inspirar um esfregar de mãos e aquecer,
Saber que há, apenas, um Janeiro tardio,
Sentir em minhas veias as cores a correr,
Pintar flores de mimosas e o amanhecer,
   Respirar inspiração de Janeiro colorido!...

Mas, a delicada flor da mimosa,
Neste Janeiro pelo frio fustigado,
É frio poema por mim congelado,
Não é rima de verso nem é prosa,
    Neste tardio poema desinspirado!...
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terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Loucura da Morte Gravitacional

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Pela madrugada, logo a seguir ao almoço,
Levava consigo as pintas da cadelita que deixara na cama,
Gravitavam essas pintas até à boca dourada do velho poço,
Boca de um laço dourada onde se enlaçara, era ainda moço,
Profundo e cheio de céu com as cores da natureza humana,
Essa doce loucura que é amor e o amor de terna porcelana,
Onde pode ser servida a relatividade de um beijo insosso,
E a quebra prometida e jurada desde a carne até ao osso;
Uma brisa salgada acariciava a fina ideia de um pijama,
   Tão fina como a marca que lhe tatuara o pescoço,
E o momento nu em suspensão,
Na mesma madrugada que todos os dias se diluía,
O mar de sangue em ondulação,
Emquanto se afogava a emoção,
Todas as madrugadas e todo o amor se extinguia,
Pela madrugada, logo a seguir ao almoço, triste e fria,
Fibras de cánhamo, talvez refeição,
A corda e o laço apertado da rejeição,
De toda a luz do universo à mais ínfima luz sombria,
O último olhar da cadelita, em vão,
E cada pinta sua que à sua volta se desvanecia,
E por cada pinta, cada pinta permanecia,
No alinhamento do fim da sua ilusão,
As pintas, a memória vazia,
O vazio morto do coração,
Todo o amor que se ia,
E amorte da razão,
Ainda nesse dia,
    De contrição!...

Pela madrugada, logo a seguir à traição,
A pequena cadelita e os seus latidos,
Com suas pintas e seus gemidos,
E os gemidos de outra paixão,
Loucamente perdidos,
Fim louco da relação,
Últimos momentos vividos,
O sangue e a corda em sua mão,
  Pela loucura da morte unidos!...
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sábado, 14 de janeiro de 2017

Eu, a Razão e o Tempo

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Nada do que à minha volta mudou,
Se fez razão que me fizesse mudar,
Fui testemunha do tempo a passar,
A uns passos do que em mim ficou,
Neste modo de, a partir do que sou,
Partisse de mim, para comigo ficar,
     Ficando com a razão do que passou!...
  
Revolve-se o tempo em meu interior,
Sinto-o passar ao ficar dentro de mim,
Sou prisão que me prende no exterior,
Carcereiro do tempo posto ao dispor,
 Tempo que me trespassa até ao fim,
    Comigo vá o tempo para onde for!...

Sou como o tudo,
Tudo leva o seu tempo,
Um pouco de nada num momento,
Eu total,
Atrás do qual,
 Me escudo,
O final,
Do erro e lamento,
A correcção de veludo,
Do grito de liberdade e mudo,
Ao silêncio e ao pensamento,
 Contemplação e, sobretudo,
       Razão e complemento!...
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sábado, 7 de janeiro de 2017

Morder a Língua

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Que nunca a minha língua se tolha,
Meus dentes nunca deixem de a morder,
Quando o veneno, -ai, que Deus me faça a folha,
-Se verta sobre a brancura limpa da  minha escolha,
Pois, -bem vindo és, ó meu desejo triste de morrer,
     Antes que, pela morte do que sou, eu deixe de o ser!...

Quiz o diabo que meus dentes caíssem,
Um a um, desiludidos após mais uma desilusão,
Quiseram os homens que as verdades não vissem,
Um a um, venderam-se à eterna mentira por omissão,
Quando descobriram que padecia de eternidade, o coração,
E como se, enquanto homens, como homens não  existissem,
    Condenaram sua Alma à própria consciência em extinção!...

Procuro o único antídoto no que resta da humanidade,
Pressinto-O na réstia que ilumina a esperança dos filhos seus,
Mas, entre os seus filhos iguais, é tão abismal a desigualdade,
Que as guerras por coisa nenhuma são uma necessidade,
    Talvez (mordo minha língua) um descuido de Deus!...


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