domingo, 28 de junho de 2015

Douro XXI (As Putas das Castas)

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E na vaidade daquele Douro macio,
Onde se miraram as castas mais castas,
Navegam os rabelos sobre um curso vazio,
Demarca-se o Marquês da demarca do seu rio,
Onde, agora, as putas das videiras mais gastas,
 Perderam as velhas uvas assexuadas de cio!...

A touriga nacional já por demais prostituída,
Nestes bordel onde Baco já caga na Tinta Roriz,
As vinhas são o putedo da colheita mais infeliz,
Ninguém sabe dizer qual a puta que foi incluída,
“A histórica colheita do Douro está perdida”,
Diz o histórico marquês,
Com toda a sua sábia polidez!...
Atrás de uma puta veio outra puta mais sabida,
Trouxeram mais putas para foderem o que se fez,
E, de uma só vez,
A casta do Douro, tida como tida,
É uma puta pior do que o míldio, talvez,
Novas castas de uma vinha esventrada e sem vida,
Essa vida sem raízes, enxertada na estupidez,
    Desaguada num Douro de História fodida!...

Pobre, pobre douro inocente,
Que tantas saudades tens, dos melhores dias,
Das vinhas, dos vinhos e da alma pura da tua gente,
Hoje fodem o teu leito ao longo de estranhas orgias,
Violam-te com as mais estranhas mercadorias,
Vendem-te como quem acha e não sente,
O Douro que foste e que jamais serias!...

E sentes que mentem,
As putas que não se confessam,
Essas castas de putas que não sentem,
O tesão dos teus socalcos onde torpeçam;
Flutuam agora bordéis, antes que os impeçam,
Já não há rabelos fortes e úteis que os aguentem,
Hajam cais firmes que as putas das castas enfrentem,
Cais que não afundem, ainda antes que lho peçam!...


Mistura-se o Douro em gin e na traição de mil licores,
Corrompem-se as águas e suas correntes perturbadas,
Ruby, Tawny e Vintage, são o amor de raízes atraiçoadas,
Os amantes do Douro, embriagados em juras de amores,
Prometeram, no altar dos socalcos, protegê-lo das dores,
Há um Douro sem identidade a vaguear em águas agitadas,
Do seu doce sangue, pouco mais restam do que suas cores,
    A Alma dos Barcos Rabelos está exposta em águas paradas!...
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quinta-feira, 25 de junho de 2015

Voar?!...


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Simples, simples…
Tão simples é o teu leve voar,
O sonho no cume de tua imensa leveza,
Miras-te no espelho de uma vasta beleza,
Ainda mais leve é o teu tão diáfano olhar,
E a luz que envolve tua força indefesa,
Débil até ao volátil segredo de pairar,
E o voo acontece nos braços do ar,
Saboreias o sonho da surpresa,
     Sonhas que o voo vai acabar!...

A realidade debruça-se sobre teu espanto,
Voam leves borboletas que te querem beijar,
Suas asas intermitentes brilham por encanto,
A luz e o brilho do pólen até ao mágico pranto,
A magia da felicidade, a leve magia de sonhar,
As flores suspensas e suas cores de encantar,
Leves como luz tecida na ilusão de um manto,
E, finalmente…
Um clarão potente,
A luz branca e subitânea,
E a falta de forças para acreditar,
Em ambas e na realidade simultânea,
     Realidade do sonho, realidade do despertar!...

Simples, simples…
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terça-feira, 23 de junho de 2015

O Imã e a Diáspora (com decoração)

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Escorre o sangue dourado,
Até à fôrma que molda a consciência,
As medalhas de ouro para a complacência,
Premiam a impostura do homem curvado,
O ouro digno do Povo foi ao povo roubado,
Para condecorar traidores e a aparência,
Parece de ouro o condecorado,
    Ouro vendido em evidência!...

Nada sobrevive no deserto de cada um,
A dignidade prostrada é postura comum,
A terra está lisa até à curva mais áspera,
Do coração já não é extraído ouro algum,
Sangue dos povos fez de ouro a diáspora,
     Há ouro no peito do patriotismo nenhum!...

Imãs desconhecidos,
Com dois polos de atração,
Repelem pobres de outra nação,
Atraem ricos estrangeiros engrandecidos,
E logo que seus sonhos sejam interrompidos,
     Já a pobreza lhes provoca um efeito de repulsão!...

Espalharam-se por caridade e casamentos,
O imã tem dois polos de intenção igual,
Um polo corrompe os pensamentos,
E antes dos justos julgamentos,
      Condecora-se o traído Portugal!...
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quinta-feira, 18 de junho de 2015

A Terra que nos Preenche (Tráfico)


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Assassinados!...
Á facada,
Por envenenamento,
Á pedrada,
Por enforcamento,
Por consentimento,
Por nada!...

Estranho mundo de engravatados,
Estranhos olhos em cada gravata,
Cegos pela indiferença dos atados,
Atidos à riqueza que, nunca farta,
Têm nas mãos o que muito mata,
Poder sobre os apoderados,
Donos de muitas vidas…
    Vidas incumpridas,
Dos raptados,
Dos vendados,
Vendidos e vendidas,
Por bandidos e bandidas,
Por senhores acima de qualquer suspeita,
Os suspeitos do costume e a Lei por eles feita,
A angústia de nada saber e o tormento,
Uma nesga de luz muito estreita,
O apagar da esperança desfeita,
O esmagamento,
A inocência que com as trevas se deita,
Inocência que não dorme, por muito que tente,
O pesadelo do medo desperto,
O extenuante despertar,
A morte,
Talvez a morte,
E a morte bem viva de frente,
A vida na vida de quem a vida não sente,
Um desejo de morrer muito forte,
A morte proibida,
De uma criança perdida,
Que, ainda sem o saber,
Seria, um dia, proibida de viver,
Vivendo na humanidade esquecida,
Esquecida dos dias com amanhecer,
Pesadelo nas noites dos despojados,
     E nem as preces as deixam morrer!...

Na terra que nos preenche com uma estranha altivez,
Onde enterramos a humanidade de nossa consciência,
Brinca uma criança com o seu sorriso e a sua inocência,
Há um silêncio que a vai cercando revestido de placidez,
Na terra que nos preenche cresce em silêncio a mudez,
Entre a serenidade e a indiferença, acontece a ausência,
Perdemos a memória e não recordamos sorrisos, talvez,
Da terra que nos preenche vai germinando a indecência,
     Cresce na terra que nos preenche, a terra por nossa vez!...

Mundo Mudo,
A Vida por nada,
     A morte por tudo!...
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terça-feira, 2 de junho de 2015

Surfar das Giestas (contramão)


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Navegando à flor do alcatrão,
Longe da fresca espuma do mar,
Conto quilômetros queimados no ar,
Vão ficando para trás as cores da razão,
Uma surfista rasga as flores só por diversão
Enfrenta o amarelo da berma que a vai rasgar;
Há giestas que ninguém vê engolidas pelo mar,
O giestal amarelo enegrece-se no coração,
    Uma giesta caída deixou de surfar!...

O mar pediu à onda e ao vento,
Que levasse a brancura da espuma,
Dissipa-se a espuma no pensamento,
Espumam as flores amarelas na bruma,
É volátil a maresia envolvida no momento,
É tão suave a gasolina em volátil movimento,
    O mar tinge-se de vermelho e se esfuma!...

Ficaram para trás as cores da razão,
Há giestas a surfar num florir violento,
    Conduzidas por giestas em contramão!...
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