segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Cancro que Somos

Ignorado,
Escondido,
Odiado,
     Temido!...
O medo de o ter,
Medo de não o deter,
Não senti-lo a nascer,
Senti-lo a crescer,
Senti-lo vivo no ser,
O medo de o saber,
E saber,
Querer viver,
 E viver,
Querer ganhar e não poder,
Apostar a vida e perder,
Fogo infernal e o sofrer,
A vida a arrefecer,
A vida e não a ver,
Medo de morrer,
Morrer sem querer,
Querer morrer,
     E morrer!...

Num dos lados da consciência,
Distante do lado que havia sucumbido,
Aproximação de todas as dores da penitência,
A lonjura da saudade que não havia morrido,
Ablativo sem dó, o remorso e reminiscência,
     O sangue, o fim do sangue, o fim sofrido!...

Sangrado das pústulas que ficaram,
O alcatrão espalha-se sobre a verdura,
As pústulas da morte e morte da postura,
A terra arável, as sementes que germinaram,
Os monstros de betão que lembranças esmagaram,
Lembranças de sementes livres da ditadura,
Sonhos livres das moléstias violentas,
A impiedade densa da negrura,
     As eternas raízes virulentas!...

A dissecação do crânio vazio,
Vaso ósseo do mais negro corrimento,
Escorre sobre o abafado céu bafiento,
Inferno mórbido exalando bafio,
Cérebro de morte sedento,
      Até ao fim!...  
E a pergunta inocente,
Inocência final e descrente:
      Pai, porque somos assim?!... 
















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