sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

As Mãos no Fogo do Zé


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Pôs as mãos na água,
E para sua grande mágoa,
Nunca vira o fogo sob a panela;
Bateu o pé,
Pela inocência do Zé,
Zé, o Povo que apanhou por tabela,
Era o único Zé; Zé, néscio e magrela,
Sempre apanhado de boa maré,
Um cãozinho curto pela trela,
Sempre muito cheio de fé,
E de cada “cadela”,
Que só visto!!...,
Ao que, por não prever o imprevisto,
Bebia dos copos onde as mágoas se afogavam;
Bem que tentava ele pôr suas mãos no braseiro,
Mas se na fervura do vinho ardia o seu dinheiro,
Até as mágoas do fogo ateado o roubavam,
Consumindo o Zé, o Zé por inteiro!...

Pôs ambas as mãos na água e sem medo,
Pelo Zé, até os seus punhos, punha no fogo,
Zé, esse indomável animal feroz e pedagogo,
Exemplo para qualquer Zé calado e quedo,
A quem Zé algum deveria apontar o dedo;
Ignorou a gasolina e o fósforo demagogo,
Os fantásticos factos e factos de bruxedo,
Apostou as mãos firmes no calor do jogo,
Foi então que numa noite, muito cedo,
Aconteceu o social e político degredo…
         do Zé!!!!!!!...
Perdida a aposta, lá se foi o segredo,
E o Zé, esse incomparável Zé inocente,
Com suas mãos como dois tições em brasa,
Escapuliu a arder do fogo à solta em sua casa,
Ardiam segredos e quentes provas, certamente,
E as ricas penas ganhas em suaves golpes de asa;
E o Zé, esse Povinho que é quase sempre sapiente,
Continuou com sua razão de Zé, crédulo e dormente,
Razão que o fogo do Zé ou de Zé algum jamais arrasa,
      Por muito que qualquer Zé ou Zé-ninguém o tente!...

Vão todos ver o Zé das Sapatilhas,
Zé farsante como todos os Zés farsantes,
Farsantes levam-lhe água e outras maravilhas,
Por ele já não põem as mãos de molho como dantes,
Dão-lhe tapinhas nas costas com cruzes e cavilhas,
Sabem do fogo e de queimaduras semelhantes,
    E da água em fervura que escalda quadrilhas!...

   
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1 comentário:

  1. Imaginemos a seguinte cena: um homem é retirado à força da sua família, preso, julgado e condenado por um crime que não cometeu. Sobreviveu a muito custo a toda a humilhação e todo o tipo de discriminação. Anos mais tarde, depois de muita luta, consegue sair da prisão e provar que fora vítima de um sistema insuficiente e de um poder judiciário corrupto. Imaginemos, ainda, que este mesmo homem ao se encontrar livre, não sabe o que fazer da liberdade, mas decide voltar a estudar, e conhece um mestre bastante excêntrico, cujas opiniões iam de encontro às posições tradicionais da sociedade. E, dessa convivência, que se reverteu em aprendizagem, ele herda, não apenas o conhecimento, mas a sabedoria de desfrutar da liberdade em nome da própria sobrevivência.

    Adiante: Imaginemos agora que estas grades não sejam apenas uma ilusão, ou parte de um cenário onde se ilustra uma ficção poética, mas sim uma representação. Ou seja: admitamos que esta imagem corresponda à realidade da atualidade.

    E digamos que a 'vítima', o 'mestre' e o 'prisioneiro atual' sejam pessoas conhecidas da nossa sociedade e, além disso, sejam personagens de um Poema. E o quanto nobre se identifica, agora, a Poesia d’Alma!

    A leitura de “As Mãos no Fogo do Zé” nos revela a seguinte visão: De um lado, o sacrifício de um povo (vítima) que luta para resistir aos desvarios de um homem (preso) que, em nome do poder, arruinou o país; do outro, a Poesia (mestre), como alerta.

    A princípio, O Poema soa como um desafio [Nunca vira o fogo sob a panela;/Bateu o pé,] a todos que acreditam na inocência do acusado e defendem a sua boa fé. Mas, e se o verso transcrito não for apenas uma paródia, mas também uma expressão de pensamento do próprio acusado? Ou se o tom poético nos transmitir uma aflição do acusado frente ao seu mestre, ou melhor, frente à representação da Poesia?

    Ou, ou. Se, se. O fato é que a Poesia existe. E eu, como leitora, ainda insisto em buscar honras para dignificar, não o Homem que está por detrás dos versos, mas o Cidadão que, indignado, escreve Poemas como se deles se tratassem verdadeiros tratados de guerra. Ou de paz, quando o caso. Palavras de tenham o poder de traduzir sentimentos, ou gritos, e levar conhecimento, ou Luz, ao imaginário cego, ou obscuro, onde parte, infelizmente, da humanidade ainda se encontra.

    E assim, aprendo a reconhecer a Arte como uma maneira de busca pela informação e de reflexão sobre a realidade/atualidade, e do desejo do conhecimento.


    Bom fim de semana.

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