sexta-feira, 24 de maio de 2013

... do vento matreiro que passa!...


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Com um dos pés na cova,
E outro meio desenterrado,
Enterra-se o velho reformado,
Acompanhado pela léria da trova,
Verso em fuga do vento acovardado,
     Medo que não passa e se renova!....

Chegados os dias da negação,
Trazem a tristeza e a depressão,
E toda a vontade incrível de rir;
Chora-se nela uma muda nação,
Mamuda e nunca farta de servir,
É sua a mama acabada de mungir,
Serve versos em plena deserção,
   À trova do medo em concepção!...

Com um pé na cova que cavou,
Cava sua cova cavada à espera,
 Já nas covas o poeta desespera,
Espera a espada que atraiçoou,
Enterrado no muro que venera,
    Junto à coragem que desertou!...

Veio mais um e já são três pés,
A mesma cova e três escavados,
Acabados num profundo revés,
 Dentro da cova dos enterrados,
Lideram escavações de lés-a-lés,
Cavam sete mares os encovados,
Lideram espuma dos revoltados,
    Vão-se na cova das novas marés!...

É a última trova dos covardes que passam,
Como os ventos matreiros que fogem de um País,
Velhos versos em fuga que muitos poemas desgraçam,
Neste País de falsos poetas que de poetas se disfarçam,
   E cantam o roubo de uma trova a um Portugal infeliz!...


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1 comentário:

  1. As particularidades políticas relacionadas às personagens históricas fazem de um tema poético, não apenas a expressão de um sentimento, ou muitos, de um homem, ou Poeta, que está à frente de seu tempo, mas também uma forma de incitar reflexões, rever conceitos e visões. E o poema “... do vento matreiro que passa!...”, privilegiando a espontaneidade, comunga com a realidade dos desmandos de uma política, ou políticos, deve ser considerado com uma manifestação social.

    E se engana quem pensa que o vínculo social, por consequente reflexo de suas demandas, desvaloriza o poder de análise, ou crítica. Pelo contrário. Ao evidenciar os erros de uma espécie de homens, se assim podem ser chamados, a poesia d’Alma produz um valor que ultrapassa o interesse pelas questões abordadas. Sua importância existe porque alguém se insurge contra a autoridade, ou poderosos, sem desprezar a ética e estética, conciliando revolta e sensibilidade de forma equilibrada e coerente. Contra, mas a favor da poesia. E só isso já compensa o prazer da leitura.

    A atmosfera poética, “trova e vento”, retrata com lirismo a classe de políticos desertores de um sistema obsoleto que paira sobre Portugal. A insurreição, instaurada pela traição que surge como temática na poesia, revela versos que deveriam ser consagrados como hino à vida plena na garantia de seus direitos, e à liberdade, na necessidade urgente de que é preciso evoluir, nem que para isso seja antecipado um funeral. Ou muitos. Senão pelo tempo em extinção, pelo próprio vento, ou ventania. Ou mesmo um empurrão.

    Mas para isso a poesia precisa ser forte. E corajosa. E ela é.


    Bom fim de semana.

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