quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Trapos...


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Velhas...
Muito envelhecidas por tanta cultura,
Palavras à condição sob tortura...
Velhas...
Sombras de palavras com muita ternura,
Luz emanada de seu viçoso epicentro,
Carne viçosa dos jovens corpos velhacos,
Muito jovens por fora de seus interiores fracos...
Velhas...
Por dentro,
Onde se rasga um coração de trapos,
Resto que de resto se mistura,
Com a graxa que tece desejos opacos,
Brilhando por fora...
Velhas...
Jovens palavras de outrora,
Tecidos intactos os cacos,
Partidos na chegada do medo da hora,
Que se vai rasgando na demora...
Velhas...
Pesadas nos estilos antigos da figura,
Figura de estilo na metáfora de quem atura,
O declínio da sapiência,
O saber das palavras de boa aparência...
Velhas...
Com amargura,
No atrito do discurso em decadência,
O amargo sabor da velha doçura,
O regresso revoltado à inocência,
De difusos vultos...
Velhas...
Palavras vestidas com andrajos consternados,
Farrapos caídos do tecido dos corpos cultos,
Tenros corações que restam...
                                                                       esfarrapados!...

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domingo, 27 de novembro de 2011

Que se Fado... (2ª farpada)


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Dai-lhe sardinha,
Ao fado,
Mal assada e gordinha,
Dai-lhe broa de milho quentinha,
Ao pobre vadio mal cantado,
Dai-lhe um velho tinto alienado,
E a voz do povo que ele tinha,
Antes de lha terem roubado!...

Devolvam-lhe a dignidade,
Ao fado,
Cantem a Alma do desalmado,
Sem essa produzida falsidade,
Ao silêncio do fadista calado,
Devolvam-lhe a sua humildade,
De cantar as lágrimas do pecado,
Com a voz de quem foi roubado,
Pelo capital da falsa saudade!...

De que raio é este fado feito,
Cantado por ricas divas sem voz,
Se quando cantam ao pé de nós,
Fazem-no sem qualquer respeito,
Pensando apenas no proveito,
Que a herança de seus avós,
Lhes legou sem haver direito?!...

Se a Alma se canta por legado,
Fazendo de conta que o riso chora,
Então está mais do que na hora,
De acabar com este atentado,
Ao fado,
Tirar o pio ao choro mal chorado,
E tocar a guitarra onde ele mora,
Desabrigo de quem geme lá fora,
O Destino que lhe foi roubado!...

Se só os ricos protegidos chegam ao coliseu,
Pagos a preço d’ouro pelo fado que não é seu,
E o sofrimento de um Povo não é declarado,
Por ser um popular sentimento disfarçado,
Então vos canto eu:
-Que se foda essa treta do vosso fado!...
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Algures... virtualmente

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Algures entre o universo virtual,
E os descalabros do vosso inconsciente,
São paridas humilhações enerves em ritual,
Fecundadas no caos cego de um vazio abismal,
Ansiosos por espalhar veneno de perdida semente,
Na plácida luz extinguida de um sofisma vidente,
Tecendo ramos no plexo sanguíneo do desejo carnal,
Em transfusão muda de um eco deprimente!...

Algures entre o universo virtual,
E os diversos paraísos que vós desejais,
Apaga-se Alma lúcida na dor do sentimento,
Esperança desalmada nos vícios do tormento,
Por desconhecerdes o vosso misterioso final,
No melhor de vós guardado em mistério igual,
Corações desterrados em vossos medos capitais,
Apostando toda a carne fraca nos desejos carnais,
Em riscos de morte indigna por uma réstia vital,
Salva na miserável vida escondida que vós levais,
Como se o tão fingido orgasmo social do momento,
Fosse fatal salvação de vosso traído pensamento,
Traição culpada em inocência de disfarce fatal,
Esquecendo de esconder um denunciado sinal,
Sinal esse que na massa da vergonha é fermento,
Fodendo o pão seco de conquistados comensais,
Ávidos por violações sobre purgados corporais,
Porque o prazer é leite de cabra sem moral,
Com borbulhas de cuninlingus menstruais,
Em engates de desencontros casuais!...

Algures entre o universo virtual,
E os desejos indecifráveis de vosso corpo,
Açoitado por descontrolados vícios do mal,
Serpenteiam viscosas bifurcações doentias,
Emprenhadas por ignóbeis pregões de porcarias,
Espreitando da álula lânguida do desejo mais porco,
Para lamber o gozo soez de um amor já morto,
Na perdição das mais desesperadas fantasias!...

Algures entre o universo virtual,
E a realidade amariçada da covardia,
Esconde-se uma verdade animal que porfia,
Disfarçando um engonço de coragem digital,
Despido daquele movimento de virtude natural,
Que troca pómulos rosados por esquálida alegoria,
Retórica de vagidos em tua maturidade bestial,
Abortado merecimento de desengonçada harmonia,
Caído da troca obscura da noite por tisnado dia,
Perdendo-se o significado no crepúsculo literal,
Do Amor que escureceu numa morte matinal!...

Algures entre o universo Real,
E a mentira de vossa fingida dor,
Dá-se o aval a um sentimento virtual,
Mais forte do que o Amor!...

Será esta a realidade procurada no prazer a esmo,
Desvirtuando o Amor no defeito reprimido de si mesmo?!...

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quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Polissonografia

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Eléctrodos para lá do cérebro desperto,
Uma teia perfeita no princípio de terminais,
Ciência confidente de inconfidentes sinais,
Suspeita de um complexo futuro incerto,
Sem segredos e de certezas tão perto,
Na incerteza dos diagnósticos fatais!...

Quatro paredes de um branco frio,
Não tão frio no frio branco de uma cor sem cor,
Há no ar Almas orgulhosas conformadas com sua perda de brio,
Desoladas descolorações etéreas descrentes no sal com sabor,
Há uma cor fria que preenche o paladar com um doce vazio,
Pressentem-se correntes de sal a desaguar naquele rio,
Das quatro paredes brancas escorre um branco rigor,
Não tão branco quanto seria de supor!...

A cor tecnica dos olhos é de um verde esperançado,
O Branco é branco particular do aposento,
Já foi público de um público mais cinzento,
A cor de cada eléctrodo tem um fim determinado,
A cor dá cor à tradução de um significado,
Há um secar rápido do tempo,
Em cada terminal fixado,
E deito-me sonolento!...

As camas só dormem enquanto não as acordamos,
São como um colo materno que nos tem com ternura,
Quando se desliga a luz a escuridão é pijama da brancura,
Que nos veste o desejo de sono com que no dia sonhamos,
Cedo se descobre que no rosto da noite tardará a candura,
Essa mesma inocência que na nossa inocência desejamos,
Mas a cama range os dentes por cada volta que damos,
E sentimos nosso sono enredado numa teia de tortura,
Ao qual o sonho dá tréguas enquanto ressonamos,
Despertando os gráficos claros de nossa agrura,
Vigiados por olhos sonolentos de verdes anos!...


Depois de voltas sobre o ranger da cama,
Entre as voltas que me adormeciam a ideia,
A noite não foi palco de qualquer drama,
Nem os eléctrodos revelaram apnéia,
 E lá regresso com uma nova chama,
Vencida que foi mais uma odisseia!...

A meu lado continuarei a ouvir minha esposa dizer:
-Assim não pode ser!!!!!!!...
E adormeço...
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domingo, 20 de novembro de 2011

Ressonar


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Dizem que sou uma zundape de 60 e tal,
Com um cano de escape escancarado,
Que ressono para onde estiver virado,
Mas, será que alguém me pode levar a mal,
Por minha opinião não poder ser mais desigual,
Quando afirmo a certeza de não ter ressonado?!...

Como é possível não ser possível dormir ao pé de mim,
E até juram que quando eu adormeço é só para os acordar,
Vão mais longe e afirmam que nem em sonhos irão concordar,
Comigo... só porque durmo uma santa noite até ao fim,
Ainda não entendi porque tanto bocejam eles assim,
E insistem nessa teoria sonolenta de conspirar,
Se eu tão perto de mim não me ouço ressonar?!!...

Não há ninguém,
Mais perto de mim do que eu,
Meu sono dorme comigo também,
Sou dele e quando me embala é meu,
Não esse embalo nos braços de Morfeu,
Que é sonho acordado de alguém!...

Só estranho esta sensação,
Quando estou muito perto de adormecer,
Sobressalta-me um rápido ronco de estremecer,
Que quase me desperta e leva a respiração!!!!...
Estremunhado procuro a causa dessa razão,
Procuro na cama culpados para me esclarecer,
Mas em vão...
A meu lado ainda ouço minha esposa dizer:
-Assim não pode ser!!!!!!...

E adormeço!...

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quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Que se fado...


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Que se... fado,
Esse vosso sentimento viciado,
Que anda a enganar no estrangeiro,
Tristes espectáculos a troco de dinheiro,
Uma dor fingida que é engano desalmado,
De um Português sentimento degenerado!...

Do canto da Alma Portuguesa,
Ao contrafeito fado mercenário,
Vai o capitalismo revolucionário,
Ajustando cordas com esperteza,
Àquela voz mimada na nobreza,
Mas não à voz do povo solitário,
Que é fado de um fado solidário!...

Se foi este o destino traçado,
Da Saudade que nos vai no peito,
Então, com todo o merecido respeito,
Que se foda esse vosso fado!...

Uma fadista só no palco,
É estrela em pó-de-talco,
Boca de língua sem aval,
Fado decalcado lá do alto,
 Saudade tão sentimental,
Que deixa em sobressalto,
A Alma deste Portugal!...

Anda o fado nas bocas finas do caviar,
Como se a voz do povo se tivesse finado,
Só as doutoras estão autorizadas a cantar,
Acompanhadas por guitarras de falso pesar,
Se a Saudade já é um sentimento vigarizado,
Então, que se foda a alegria do triste fado!...
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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Galinha


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Nunca haviam visto uma verdadeira galinha,
Ovos saborosos eram pequenas caixinhas ovais,
Uma incrível engenharia perfeita como as demais,
Do branco é ao galinha o põe ia uma fácil adivinha
Eram o cavalo branco de Napoleão em toda a linha,
Brancos colarinhos longe de galinácios nacionais!...

O papel-moeda  era filigrana de obras de arte,
A moeda era um ente querido de precioso metal,
Ai, os cunhos das cunhadas de esposas em parte,
Cunhadas na testa dos que sofreriam um enfarte,
Traídos pelo valor elevado de um irmão desigual,
Confiança dada à consignação pelo bom comensal,
Senhor de antecipada prestação por seu baluarte,
Pago pela esposa do irmão como primeiro sinal!...

Todos os despojados do que nunca tiveram,
Protegem agora todas as galinhas inocentes,
Defendem o cu da galinha com unhas e dentes,
Os ovos já não são os que os arquitetos fizeram,
Almoços fáceis daqueles que nunca os tiveram,
Já são as galinhas preciosidades transcendentes,
Canja de pobres e caldos de galinhas inteligentes,
Esses que esqueceram onde as penas estiveram,
   E estavam eles da importância do caviar cientes!...

Agora nestes velhos tempos novos,
Já não é novo ver por aí a cada passo,
As velhas terras que alimentam o espaço,
E as gordas galinhas a chocarem os ovos,
No torrão de suor debaixo do braço!...
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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Poema?!...


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Diz quem não o leu,
Que foi o Poema mais lido,
Sabe-se que ninguém o escreveu,
Ainda que todos o tenham como seu,
Escrito na Alma que trazem consigo,
Poema feliz em silêncio proferido,
Por quem em dor não sofreu,
Lamento que trago comigo,
Por não ser a poesia que podia ter sido!...

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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Folhas...

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Afagada a cor da última folha que resta,
Pela lágrima em seiva de um olhar meigo libertado,
Liberta transparências dos carreiros duma densa floresta,
Que agradecem os veios em pagos de um castigo calado,
Por flutuantes perdões verdes de um seco silencio parado,
Remissível no sossego da dádiva que ao grito empresta,
Soltando a folha muda da palavra nua que se manifesta,
Num espairecido suspiro de verde adeus ignorado!...

Na força da folha que falha,
Faz-se forte a fábula que fala,
Excitando a façanha que embala,
Faguice que na nudez pálida se espalha,
 Tocando vestes nuas caídas de um farto seio,
Transformando em ternura de uma etérea poalha,
E que de luz a liberdade do suspiro seguinte que se cala,
Porque a última folha é olhar verde caído de uma eterna batalha,
Conquistada na perda da cor que na vida, entre a morte, à dor vive alheio!...

No calculismo de ventos sádicos que fustigam as nervuras das árvores sem tendência,
A frieza altiva de árvores desenraizadas, gelam o frio com promessas de mais frio,
Envolvem-se em gelados unguentos untados nas serpentinas de inocência,
E culpam as serpentes envolvidas por espirais ventanias de exigência,
Convencendo as palavras bífidas a serem berços de leito macio,
Prontas para acolher os beijos ocos de um fruto vazio,
Eco adormecido de atenuante sonolência,
Do interior das árvores sem cio,
Inverno de sua penitência!...

Uma a uma, enquanto o tempo não dorme,
Delicadas, abrem-se nuas mãos suavemente,
À cor esmaecida de um verde sono ausente,
Juntam-se os gestos num lamento enorme,
Repetindo-se entre o abandono conforme,
No policromo frio de uma folha jacente!...

Na floresta sem cor de muita gente,
Há folhas caídas dos olhos das árvores que choram,
Derramando a seiva de esperança que o coração sente!...

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quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Firme

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Caíram as promessas de Juras,
Nas crédulas figas esconjuradas
Ainda vertiam seiva das nervuras,
Oferecendo matizes desmaiadas,
Às envelhecidas cores resignadas,
Plantam-se árvores sobre pinturas,
Beleza de descoloridas amarguras,
 Superstição de juras amarguradas!...

O que foram árvores Altivas,
Coroadas de copas frondosas,
Continuam árvores corajosas,
Estóicas em suas perspectivas,
Sabendo ser árvores preciosas,
Únicas de si sem alternativas!...

Também há Mulheres assim,
Seguras de suas estimativas,
Sempre Árvores até ao fim!...

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domingo, 6 de novembro de 2011

...do Olhar

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...Entre os pingos das nuvens felizes por chorar,
Brilhavam lágrimas que riam de velhos caudais,
As cores do arco-íris nunca eram belas de mais,
Eram todas as lágrimas espelho do Sol a brilhar,
Beleza que impelia os rios ao encontro do mar,
Talvez lágrima, talvez um pingo furtado ao olhar,
Quem sabe, um barco avistado lá longe do cais,
Ou anil raiado nos olhos cansados de navegar!...

No olhar nostálgico de vidradas janelas,
Bátegas embaciadas revelam olhos de limpidez,
Um corpo frágil forma-se de feminina timidez,
Da Alma vislumbram-se Almas de mil cautelas,
Vidros finíssimos acariciados por frágeis lamelas,
Dançam entre a transparência de tímida nudez!...

Entre lâminas transparentes que cortam ao ver,
Espelhos d’água serão testemunhos das quedas,
Da espuma às lágrimas que não quiseram ser!...

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quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Desejasses...

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Desejasses transvestir-te de tua lágrima contrafeita,
Oferecer tuas mágoas cantadas em côngios antigos,
Desejasses tu revestir-te de teus contrafeitos amigos,
Oferecer transbordos saudáveis de tua cúmplice maleita,
Desejasses teu abraço contrafeito que por ti se estreita,
Oferecer a razão directa de melancólicos desejos antigos!...


Desejasses o adiado beijo e teu desejo,
Desejo que por beijo meigo te beijava,
Beijasse a Esperança teu desejado pejo,
Desejando o beijo que um beijo amava,
Esse doce desejo que o beijo desejava,
Ao beijar teu coração num terno ensejo,
E o Amor por Amor se enamorava!...

Desejasses a morte que por ti morresse,
Matando teu desejo que por alguém viveu,
Desejasses a vida que por ti alguém volveu,
Vivendo do desejo que por ti se apetecesse,
Desejasses tu a derrota que por ti vencesse,
Vitorioso desejo que por alguém se perdeu!...

Escrevesse teu desejo uma rima de Amor,
Coma ternura delicada do Poema beijado,
Lesse teu sorriso um terno beijo desejado,
Nas pétalas felizes de uma rosa branca flor,
E tuas juras fechadas em páginas de alvor,
Seriam livro aberto do teu coração aliviado!...

Desejasses tu uma rima de Amor!...
Desejasses tu um Desejo!...
Desejasses tu esquecer tua Dor!...
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