quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Tiro

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…Olhou para a lápide polida,
De duas lágrimas e um trémulo suspiro,
Uma das filhas do desgosto foi contida,
A outra escorreu entre rugas da vida,
E despediu-se da raiva com um tiro!...

…negou a côdea do último pão,
Do miolo restou apenas um suspiro,
Das searas colhia-se a recordação,
Era tempo de escolhas e oração,
Desfez-se da fome com um tiro!...

…Aceitou o último pré,
Despediu-se da parada com um suspiro,
Trocou passos da marcha pelo pé ante pé,
Acariciou a pistola roubada com muita fé,
E despediu-se da podre paz com um tiro!...

…Esperou na praça partindo de uma premissa,
Olhou o céu e azulou-o com um longo suspiro,
Lembrou-se da fé de Cristo, não da última missa,
Abraçou os risonhos ministros e fez-se justiça,
Um cravo impune foi morto com um tiro!...

…De um tiro que bastou,
Ficou cinzelado o exemplo,
Que tudo mudou!...
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5 comentários:

  1. Não me atrevo a beliscar o momento, a estragá-lo.
    Acabou e tudo mudou... com um simples tiro recusou a côdea de pão!

    Mas o dia (re)nasce na linha do azul dos céus e haverá sempre rostos a sorrir num grito de vida, num raio de sol, na ponta da luz, no mar onde outros barcos navegarão...
    Vela ao vento, vento de sul!!!
    Talvez ...
    houvesse outra solução.

    Abraço
    Ana Sofia

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  2. ...um tiro... cuspo branco dos ministros enfastiados, catraios, risonhos da justiça bastarda, viciada na elasticidade contrafeita…


    ...um tiro que, uma vez acariciado p'la pistola, se cospe logo de seguida o sangue do projéctil roubado...

    ... um tiro cheio de fome que se alimenta com uma só mão…...que alivio!


    ..ah!!!

    T'Abraço Poeta

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  3. Apesar da temática de morte voluntária, ou antecipada, ser entendida como intimidação diante das dificuldades do viver, o poema “Tiro” substitui a tragicidade da decisão funesta pelo alívio de uma vida que não conseguiu assimilar sua dor, e sem conferir fracasso ou derrota, encontra na morte um refúgio.

    A movimentação dos verbos delimita o território que é de sofrimento e justifica sua sentença: “Olhou / E despediu-se da raiva com um tiro!...”; “negou / Desfez-se da fome com um tiro!...”; “Aceitou / E despediu-se da podre paz com um tiro!...”; “Esperou / Um cravo impune foi morto com um tiro!...”.

    Pausa.

    A poesia d’Alma é um bem que tem como principal característica os princípios da liberdade e da justiça social. Se fugir à luta, se ceder às dificuldades da vida é poético, onde está o poder de humanização que a poesia tem? Ou, onde está a poesia que falta à vida para resistir à morte?

    “…De um tiro que bastou,” e que confirma que enquanto não existir homens, e sejam poetas ou não, que usufruam do talento que têm à disposição da humanidade, através da diversidade que o fazer artístico permite, sendo chama e luz à visão crítica do mundo, e portanto, capaz de transformar comportamentos, a arma que pensamos estar apontada ao outro não passará de um tiro pela culatra à nossa consciência.

    O olhar inocente, os lobos e joaninha ratificam: em KrystaldAlma a poesia não jaz. É nosso dever e nossa obrigação contribuir para que ninguém saia dessa vida sem o mínimo de dignidade e sobriedade que as circunstâncias exigem.


    ¬

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  4. A morte como uma saída? sim, tenho pensado nisso...
    Porque às vezes o sorimento dói tanto (é propositado, o pleonasmo) que a gente perde o tino...
    Não há momento algum que não possa ter uma leve brisa de 'sperança...O tempo escorre por nós ...e nós embarcamos com ele para o desconhecido...agora...fazer da morte uma fuga...não...não...não!

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  5. Olá

    Vejo a morte como solução para problemas , por mais sérios que sejam, mesmo num momento de desespero, um acto de covardia...

    A esperança nunca deve morrer...

    Parabéns pelo poema.

    Bjs.

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