quarta-feira, 27 de julho de 2011

Impotência

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Deitada na cama,
Sob lençóis brancos de linho,
Recebe seu marido que a Ama,
Abre suas pernas à falta de carinho,
Na certeza do prazer se perder no caminho,
E esconde dos olhos a lágrima que não engana!...

Vinha-se nos ais dos orgasmos sonoros que fingia,
Naquelas madrugadas casuais do frio tesão do mijo,
Aproveitados momentos tristes de um oportuno pau rijo,
Do carinhoso marido que a ele mesmo há muito tempo mentia;
A meio da função a verdade murchava dentro da esposa que sofria,
Restando o Amor que oferecia lágrimas fingidas de grato regozijo!...

Uma Mulher esmagada pelo submisso peso doméstico do drama,
Sente no nervoso corpo de fogo a necessidade de sentir alguém,
E ainda que não mostre sua necessidade de sentir-se também,
Teme compreender os desejos que o seu corpo proclama;
Na ausência dos orgasmos interrompidos com desdém,
Ajoelha-se ardendo de tesão aos pés de ninguém,
Suplicando o perdão pelo pecado que a reclama!...

Não sabia amaldiçoar o Amor prometido,
Jurara respeito sem desvios infiéis na sua ventura,
Mas tanto respeito dedicado e tão sufocante ternura,
No leito era um cativeiro de doloroso prazer oprimido,
A um coito frio, sem qualquer prazer feliz, resumido,
Transformando a cama numa mesa de tortura!...

Penetrada pelo vigoroso tesão da vida,
Inchado no órgão selvagem que a possuía,
Revolveu-se dentro de si uma força incontida,
Liderada por um anjo que entre demónios ardia,
Enlouquecendo de gozo o pudor que se subvertia,
Salivando lágrimas de arrastada virgem arrependida,
Domesticada na contenção de uma educação perdida,
Em desejo escondido entre as coxas que o fogo lambia,
Atiçando orgasmos infernais de uma Mulher agradecida!...

Há muitos orgasmos fingidos entre lençóis,
Há abundantes ejaculações de olhos que choram,
Há tesão em cantos presunçosos de mudos rouxinóis!...

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3 comentários:

  1. ...eis uma forma poética de encarar a realidade. Interrogante e interiorizante sem dúvida!

    Um beijinho
    da
    Assiria

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  2. Uma cena e um poema. Um homem, uma mulher e a cama. E d’Alma, narrando em timbre sereno e objetivo, ousa e provoca o desconforto com o poema “Impotência”, envolvendo a sexualidade humana, que, por mais falada que seja, ainda persiste com um tema-tabu, onde os símbolos desse uniVerso repleto de enigmas e obscuridades são trazidos ao plano explícito da realidade, prevalecendo a sensibilidade na arte de fazer poesia com cenas reais do cotidiano.

    A vida protege. Os lençóis envolvem e guardam segredos que só a poesia revela. A cultura do medo produz mecanismos de defesa, às vezes culpa, às vezes compaixão, ou mesmo uma tolerância jamais imaginada. Quem não experimentou, já soube por referencial uma verdade marcada pelo cumprimento de um ato fisiológico separado do desejo [“Aproveitados momentos tristes de um oportuno pau rijo,], resultado de uma disfunção sexual pelo excesso do desejo de não desejar [“Do carinhoso marido que a ele mesmo há muito tempo mentia;”].

    A conivência molda a relação, tanto amorosa, quanto sexual. Homens e mulheres aparentemente satisfeitos, fingem. O corpo, entretanto, este traidor, reclama. Se direitos, não se sabe, mas bem sabe como fazê-lo e a que preço fazê-lo. Primeiro o corpo responde pela falta de prazer [“Na ausência dos orgasmos interrompidos com desdém,”], em seguida a consciência cobra [“Suplicando o perdão pelo pecado que a reclama!...”]. Surgem os conflitos e o poema apresenta-nos o saldo sobre o custo interior desses sentimentos [“Transformando a cama numa mesa de tortura!...”].

    A dinâmica poética assume sua vulnerabilidade e expõe a carência feminina em relação à complexidade de um processo que não oferece alternativa [“Atiçando orgasmos infernais de uma Mulher agradecida!...”].

    Unânimes, poema e leitor, confirmam que somente o sexo [“Há tesão em cantos presunçosos de mudos rouxinóis!...”] valida a existência. Aos desejados, e, mesmo, aos indesejados, mas sempre por desejo, ainda que sem amor, mas sempre, incondicionalmente, por amor.


    ¬

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  3. Porra

    Ao quisto chegou

    quando o mais simples
    se torne complexo

    para quem tem o prazer de pensar
    com as palavras
    de Fernando Pessoa
    precisa mente
    as que ele nunca disse

    Na verdade relativa de todas as coisas
    a verdade é um fingimento

    Força meu caro

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