sexta-feira, 1 de julho de 2011

"Canta Parolaço"


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“Canta Parolaço”,
Era um mítico personagem,
O canto era seu desembaraço,
Seu sucesso um verdadeiro fracasso,
Só comparável à cultural saloia imagem,
Que, a verdade bem escrita de passagem,
O teve como farrapo de culto ricaço!...

Quando pela freguesia,
Qualquer praguita aparecia,
Remelavam-se olhos com andaço,
Aos vómitos de viroses seguia o cagaço,
Eis que do nada se apresentava a valentia,
Com o seu canto de exemplar filosofia,
O incomparável “Canta Parolaço”!...

Metro e meio de macho perfeito,
Quarenta e tal quilitos de peito feito,
Cantava “olhem eu aqui bem aprumado”,
 Contaminando toda a cultura do espaço,
Com seu incrível ego satisfeito,
E tal era seu inchaço,
Que deixava admirado,
Até o mais acostumado,
Ao intrometido embaraço,
De levar com o “Canta Parolaço”!...

O fato branco pelo próprio corpo engomado,
Que lhe fora dado por um ilustre escriva defunto,
Insuflava-lhe o ar de um preto brilhante desbotado,
Cor julgada pelo lustro daquele “Canto” afortunado,
Ídolo bem ataviado dos mal vestidos sem assunto,
Esses parolaços iguais ao canto e seu conjunto!...

Lendas falam de monstros terríveis,
Leões esfomeados dados à crueldade no paço,
Em ruelas, touros eram largados em investidas horríveis,
Gritos exasperados ainda são igualdades tão audíveis;
Então, caído do Céu, ouvia-se o protector passo,
Da destemida bazófia do “Canta Parolaço”!...

Muito tarde se deitava,
Para levantar-se muito cedo,
Exausto adormecia em sossego,
Pobre “Canta Parolaço”,
Nos braços de Morfeu sonhava,
E já no regaço do aconchego,
No silêncio e em segredo…
O “Canto” só,
 Que balbuciava:
-Mãe!...
Eu tenho medo!
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2 comentários:

  1. Meu caro amigo POETA;
    Mais um excelente poema, com a qualidade de sempre.
    Gostei imenso.
    Um forte abraço.

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  2. Transcendendo o limite da criatividade e, optando pelo fazer poético onde a estrutura cotidiana e a arte não se desvinculam da realidade, “Canta Parolaço” é um poema que tem a temática social como fonte inspiradora.

    O mito, através de seu protagonista, confere atualidade à poesia [““Canta Parolaço”, / Era um mítico personagem,”] e revela a hipocrisia social. O ritmo que sustenta a sonoridade do poema é encantador. O refrão [“Canta Parolaço”] nos convida à reflexão. As aparências enganam. O discurso também [“Que, a verdade bem escrita de passagem,/ O teve como farrapo de culto ricaço!...”].
    Combinando poeticidade com a história e sensibilidade com serenidade, a imaginação não faz parte de uma fantasia delirante [“Remelavam-se olhos com andaço, / Aos vómitos de viroses seguia o cagaço,”]. Ao contrário. Mesclando ficção e realidade, a linguagem poética e visual REcria símbolos e revela a identidade de uma cultura dependente de modelos de força e poder [“Eis que do nada se apresentava a valentia,”].

    A estética poética contribui decisivamente na comunicação de um sentimento comum. Construímos imagens e com elas, sensações. [“Cantava “olhem eu aqui bem aprumado”, / Contaminando toda a cultura do espaço,”]. Não importa a classe, a raça ou o sexo, ou a nacionalidade. Experimentamos a poesia e saboreamos ao mesmo tempo, um gosto amargo e doce [“Ídolo bem ataviado dos mal vestidos sem assunto, / Esses parolaços iguais ao canto e seu conjunto!...”]. Igualmente ídolos, igualmente fãs. Uma posição, no mínimo, desconfortável.

    A poesia d’Alma é um mistério evidente, e como tal, sempre surpreendente e imprevisível. A ruptura dos padrões convencionais é uma constante. O verso, à semelhança contraventora do uniVerso [“Da destemida bazófia do “Canta Parolaço”!...”], contrapõe-se à ética e transforma conceitos para no desfecho poético revelar-se: “Muito tarde se deitava, / Para levantar-se muito cedo,”. A solidão tem custos desnecessários, e, às vezes, nenhum benefício.

    A fragilidade. Durante o sono, ou o sonho, a segurança, onde a imaginação não é fruto de uma ficção [“-Mãe!... / Eu tenho medo!”].

    Entre Super-heróis, Morfeu, e mesmo a Esfinge... A poesia. Ou a devoramos, ou somos devorados.

    Sou devorada.


    ¬

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